Abismo sem fim de absurdos ininterruptos

Cronologia do dilúvio: vamos sucatear para privatizar. Inundação. Agora eles se ferraram a inundação chegou antes, pensou. Não, agora eles vão provar que precisa privatizar. Por quê começaram a falar do Katrina? ‘nossa dizem que é tipo o katrina’. Dois motivos. O Melo contratou empresa de consultoria que atuou naquela tragédia. Finalidade? Talvez isentar a prefeitura de responsabilidade sobre a tragédia e culpabilizar o Dmae – sucateado – para privatizar. Lá nos eua a empresa foi responsável por administração em escolas públicas fazendo alunos pagarem parte das bolsas de estudo. O outro motivo – o Furacão Katrina é a única tragédia que vem na mente de nós povo colonizado que faz vista grossa para cataclismos noutros cantos do mundo.

Seguindo a cronologia da desgraça- bombas de escoamento para fora da cidade não funcionaram, depois só parcialmente, agora depois de quase um mês só 11 das 23 estão funcionando, e nem todas operando fullspeed motorhead! Ponham o lixo na rua para coleta! Com lixo entenda-se vidas das pessoas, pois eram coisas fundamentais ou ganha pão ou alegria de viver! Daí cai A água e “o lixo” entope os bueiros. Na próxima coletiva o prefeito diz que não sabia que horas ia chover!! Nas suas próprias palavras o ‘climatempo’ é falho não deu a hora exata da chuva! Não se desculpa por nada e ainda culpa todo o resto dos profissionais tudo. Daí abre a comporta pra escoar a água. Como a comporta que protege a cidade de enchentes foi aberta? Arrancada como eram os portões medievais por inimigos! Mas nem fechadas completamente estavam. Pra quê fechar? Agora fecha a enchente avançou! Mas a porta sumiu bota saco de areia.

Essa cronologia tá desordenada porque é assim mesmo que aconteceu.Vamos de improviso porque planejamento não é com nós da prefeitura nem do Estado. Improviso é valido pra mim com balde na goteira da sala, não para governantes acharem que podem colocar caminhão do exército encostado na comporta pra ela não voar! Mas cadê caminhão? Não chegou a tempo! Hahaha isso é a definição de rir da desgraça alheia? Vamos reconstruir o Rio Grande dar suporte pras famílias com Auxílio Reconstrução. Não vai dá porque a prefeitura esqueceu de cadastrar os moradores.

Rabisco com hidrocor e esferográfica numa foto de revista que fiz a mais de dez anos atrás. Uma cidade e um abismo profundo. Nem eu poderia imaginar que caberia perfeitamente numa realidade futura. Segue chovendo sem parar em Porto Alegre, alguns bairros completamente alagados sem previsão de quando vai escoar a água. A cidade está devastada. Ruas vazias, cheias de entulhos, lama, peixes mortos, garças nas avenidas comendo os peixes, tartarugas mortas, mal cheiro. Crise sanitária com pessoas ficando doentes. Uma prefeitura e um Governo ineptos.

Sucateamento Privatização Capitalismo neoliberal Negacionismo climático Necropolítica Malcaratismo Incompetência.

[Fazendo um mês da maior tragédia climática do Rio Grande do Sul. Até agora 169 pessoas morreram, 50 estão desaparecidas, mais de 800 feridas. São 2,3 milhões de pessoas afetadas em 471 cidades. Há mais de meio milhão de desalojados. Mais de 82 mil pessoas foram resgatadas e mais de 12 mil animais resgatados.]

Porto Alegre Inundada Porto Alegre Sitiada

Porto Alegre inundada
Porto Alegre sitiada

Os proclamados governantes venderam o que puderam e sucatearam o que ainda não conseguiram vender. O secretário da pasta de proteção à vulnerabilidade social e comunitária pediu exoneração do cargo para uma viagem de férias a Europa em meio a maior enchente da história do estado. Pessoas abandonando suas casas, lutando por sobrevivência, em vulnerabilidade extrema. Ele sai de férias a população fica ilhada. Sem água, sem luz. Muitas dependendo de doações para seguirem vivendo.

Famílias desabrigadas que perderam tudo que se perderam nas águas deixando alguém com saudade e dor.

A enchente alcança o pé da nossa rua e estamos salvos por uma lomba. Me coloco no modo racional diariamente se minha mente vagar começo a pensar que algo pior pode acontecer e a água subir descontroladamente. Faço esse exercício todos os dias para que minha mente mantenha o controle e eu possa cuidar de quem precisa de mim. Não podemos reclamar ao ver ao nosso redor tanta gente em situação que palavras não existem para descrever.

O sistema de bombeamento de água para fora da cidade é de uma tecnologia dos anos 50, 60 e 70, criado depois da última grande enchente de 1941. A enchente de agora a supera. As bombas estão em áreas que alagaram. Precisa-se de uma engenharia atual para realocação dessas bombas. As comportas de contenção de água na cidade estão a 6 anos sem manutenção, o sistema é manual porque a estrutura foi roubada e nunca reposta. Claro que no nível da enchente as comportas não teriam dado conta, mas é um sistema de contenção abandonado. O descaso esta aí pra todo mundo ver.

A bancada ruralista no Congresso Nacional procura reduzir cada vez mais as áreas de proteção ambiental. As matas ciliares que se encontram às margens dos rios têm papel de controle de enchentes mas estão sempre na mira do agronegócio. O governador do Estado flexibilizou regras ambientais ao reformular o Código do Meio Ambiente do RGS favorecendo apenas interesses capitalistas.

Mas a força das pessoas se reafirma a cada dia.
Hoje é o primeiro dia que vimos o recuo da água.
O rio esta baixando, o sol apareceu. A espera continua. Nos vingaremos.

9 de maio 2024 centro histórico de Porto Alegre

[No dia 1º de maio de 2024 começaram as enchentes no Vale do Taquari e região. No dia 2 foi feita a medição do rio Taquari que passou de 30 metros de altura o maior nível registrado da história. Moradores tiveram que sair as pressas de suas casas. No dia 2 Porto Alegre começa a alagar com o rio Guaíba igualmente ultrapassando níveis históricos. O que acontece nos dias que se sucedem é uma enchente sem precedentes que já superou a grande enchente de 1941.]

8 de março – Nem Sujeição Nem Apatia!

Letra do som Nem Sujeição Nem Apatia da banda No Rest que sou vocalista.
Faixa da coletânea Inflamar lançada no final de 2019. Ouça a faixa aqui.

1º de maio e a divisão sexual do trabalho

No Dia do Trabalhador lembremos que os direitos conquistados no trabalho não são iguais para homens e mulheres.

A divisão sexual do trabalho oferece às mulheres trabalhos mais precários, com salários menores que dos homens mesmo quando as funções são iguais. A divisão sexual do trabalho coloca a mulher na esfera doméstica para um trabalho não remunerado, desvalorizado e considerado uma ‘obrigação feminina’. Tal obrigação não deixa de existir na vida de mulheres trabalhadoras assalariadas sobrecarregadas pela dupla jornada. A divisão sexual do trabalho garante que a prostituição e outras formas de exploração sexual sejam a única ou a mais viável saída que muitas mulheres têm para sobreviver, lhes impossibilitando de fazerem escolhas propriamente ditas.

Toda divisão feita a partir do sexo assegura que as mulheres sejam subordinadas aos homens. Existe uma simbiose muito bem articulada entre o patriarcado e o capitalismo que se sustentam com a exploração do trabalho e dos corpos das mulheres. É importante reconhecer a mulher pertencente a uma classe porque a subordinação é imposta, materializada pelas opressões que atingem todas as mulheres, agravada pela intersecção de opressões.

No dia do Trabalhador lembremos que a força de luta das mulheres por conquistas trabalhistas não seja mais um trabalho a ser utilizado e explorado ao negar às mulheres lutas por conquistas próprias e específicas da nossa classe.

A fala de Eduardo Bolsonaro escancara a misoginia da linguagem pretensamente inclusiva

É possível que agora que o Eduardo Bolsonaro se referiu às mulheres como “portadoras de vagina” as pessoas compreendam o quanto é ofensivo e reducionista utilizar termos como este para se referirem a nós mulheres. “Portadoras de vaginas”, “pessoas com útero”, “pessoas que gestam”, são termos tidos como inclusivos, já que falar ‘mulheres’ é excludente na cabeça de muitos que se dizem progressistas. Então se você fala que absorventes deveriam ser gratuitos para as mulheres, alguém vai ‘exigir’ que você ‘corrija’ o termo para “pessoas que menstruam” porque “mulheres trans” não menstruam. Eu sei que também dizem que são termos para incluir “homens trans” que não querem ser chamados de mulheres. Mas isso nunca resolveu nada nem para essas pessoas que não podem ser reduzidas a portadoras de genitais ou órgãos, é uma coisa desumanizante. É ofensivo e é uma forma de apagamento de mulheres. A palavra mulher tá quase uma palavra proibida. Quando feministas apontam o problema desses termos de “substituição” somos atacadas com xingamentos e taxativamente comparadas com conservadores. Isso deveria servir de aprendizado também para que os debates com feministas sejam feitos com argumentações e não ataques convenientes e de silenciamento de mulheres. Porque por conservador, olha ele aí.

‘De repente’ soou ruim, estranho, misógino e nitidamente como um ataque as mulheres se referir as parlamentares como portadoras de vaginas. É o que nós feministas radicais estamos dizendo faz muito tempo. Até mesmo entre feministas temos tido dificuldades quando denunciamos que somos desumanizadas constantemente com a utilização de termos proclamados inclusivos. Termos que só resultam no desaparecimento do porquê das nossas lutas e no nosso próprio desaparecimento. Isso porque mulher é pertencer a uma classe subjugada, e somente nos reconhecendo como classe que é possível nos organizarmos e combatermos as opressões contra nós. Se não existe mulher não existe opressão contra a mulher.

‘Estatuto da Gestante’ – O novo Projeto de Lei de ataque às mulheres

Nota da Frente Pela Legalização do Aborto do Rio Grande do Sul

URGENTE: NOVO PROJETO DE LEI CONTRA VÍTIMAS DE ESTUPRO!
Mais uma jogada anti-mulher em plena pandemia para agravar ainda mais a crise para as mulheres. Está na pauta do Plenário do Senado o projeto que impõe a “bolsa estupro”, o ‘Estatuto da Gestante’, que apesar do nome, não corresponde a uma garantia de direitos. Poderia ser chamado ‘Estatuto contra a Gestante Estuprada’, ou o ‘Estatuto Conto da Aia’ – o conto que se passa num futuro distópico onde as mulheres servem apenas como encubadoras.

Tal qual o Cavalo de Troia, o Projeto de Lei de autoria do senador obscurantista Eduardo Girão, usa como disfarce a defesa de políticas públicas às mulheres gestantes, repetindo, em seus artigos, direitos já garantidos pela Constituição.

Camuflado em meio a esses artigos, encontra-se o verdadeiro objetivo do Projeto de Lei, que é o de proibir o aborto em todos os casos incluindo os já previstos em lei.

O Projeto de Lei dispõe sobre a “defesa da vida da criança concebida” e coloca em pé de igualdade um embrião a uma mulher, afirmando que o atendimento médico deve dar igual prioridade a ambos, negando totalmente o direito ao aborto à mulher cuja gestação lhe causar risco de vida.

Mais grave ainda, ao falar sobre a “gestante vítima de violência sexual”, o Projeto de Lei quer retirar por completo a possibilidade de realização de aborto, e, ao invés disso, quer impor que lhe seja oferecida apenas a possibilidade de adoção, caso não queira “acolher a criança”.

Aliado a isso, o Projeto de Lei inclui artigos sobre “o direito do genitor” de ter acesso à criança, sob pena de responsabilizar a mulher que impedir proximidade do filho gerado através de estupro com o estuprador.

É óbvia a intenção de impedir a autonomia das mulheres, e de aceitar por lei a violência sexual contra as mulheres. A Constituição Federal já garante a ambos genitores o direito de participação plena na vida dos filhos. Porém, atualmente, estuprador obviamente não é considerado como pai, e não tem direitos em relação ao filho gerado por estupro.

Dessa forma, ao assegurar o direito de acesso ao genitor à “criança concebida” logo após referir-se à “gestante vítima de violência”, o Projeto de Lei visa normalizar a violência sexual e garantir o exercício do poder familiar ao estuprador, em conjunto à vitima. O estuprador segundo o projeto, seria responsabilizado por pagar pensão alimentícia e teria direito à visitação e à disputa de guarda.

Agora imaginem o seguinte cenário: uma mulher vítima de estupro sendo forçada a prosseguir com a gravidez; sendo pressionada a “acolher a criança concebida” (nas palavras do próprio PL), e sendo mais uma vez forçada a manter contato permanente com seu estuprador:

– Sendo forçada a registrar o nome do seu estuprador na certidão de nascimento do filho;
– Sendo forçada a entregar o próprio filho aos cuidados do seu estuprador, que terá direito à visitação paterna;
– Correndo risco de ser processada judicial por seu estuprador em disputas da guarda pelo filho gerado pelo estupro.

A violência contra as mulheres tem de parar, e nao ser normalizada por lei. Mulheres em idade reprodutiva neste país estão sofrendo violências e morrendo, milhares são meninas com menos de 14 anos já nesse enfrentamento.

PRECISAMOS BARRAR MAIS ESSA TENTATIVA DE ATAQUE AOS NOSSOS DIREITOS REPRODUTIVOS E SEXUAIS, QUE SÃO DIREITOS HUMANOS FUNDAMENTAIS!

DENUNCIAMOS E RESISTIMOS!

FrePLA

PL 232/2021 propõe impedir o aborto de gravidez decorrente de estupro

A cortina de fumaça é justamente outra. O programa do governo e seus apoiadores tem como prioridade extinguir os direitos das mulheres. No Brasil, o aborto é permitido em gravidez decorrente de estupro, de risco de vida à mulher e quando o feto é anencéfalo. Também é permitido para meninas porque a gravidez de uma menina é sempre de risco e decorrente de estupro, nunca é consentimento, é estupro de vulnerável, e isso vai para além de leis. Acontece que o aborto legal já é de difícil acesso para mulheres e meninas, que acabam recorrendo à clandestinidade, fazendo parte muitas vezes das milhares que morrem todos os anos devido aos abortos inseguros. O aborto legal é também negado, coisa que não poderia ocorrer, como aconteceu no caso da menina de 10 anos estuprada pelo tio no ES, tendo que se deslocar para Recife enquanto a chamavam de assassina.

Todas as dificuldades e recusas de acesso ao aborto são falhas graves em garantir os direitos humanos das mulheres. O aborto precisa ser legalizado em todos os casos que uma mulher assim queira e necessite. Essa é uma luta árdua e longa, mas o que temos é uma campanha anti- mulher implacável, que busca retirar todos os nossos direitos, os já alcançados e os que ainda estamos lutando a duras penas para alcançar. Um projeto que exige boletim de ocorrência e exame de corpo de delito para comprovar o estupro é projeto para institucionalizar ainda mais a violência misógina. Ele apenas serve para impedir um direito que é das mulheres e para inflamar um discurso que se tem de que a mulher mente quando diz que é estuprada, ao mesmo tempo que abraça e protege incondicionalmente os homens estupradores. Isso é o masculinismo. E o masculinismo é infelizmente propagado muitas vezes por mulheres, que fazem uma luta contrária à nossa libertação das opressões do patriarcado. Talvez aguardando alguma migalha do banquete onde predominantemente os homens estão saciados. Assim é a PL de Carla Zambelli apresentado no 04.02.2021, onde diz “…tornar obrigatória a apresentação de Boletim de Ocorrência com exame de corpo de delito positivo que ateste a veracidade do estupro, para realização de aborto decorrente de violência sexual”. Nenhuma mulher estará livre enquanto todas não formos livres.

Reunião organizativa da FrePLA – 09 de fevereiro

Chamada para reunião da Frente Pela Legalização do Aborto do RS:

É fato público e notório que a conjuntura atual paralisou muitos aspectos da nossa vida cotidiana, inclusive a nossa forma de organização e militância. Entretanto, nossos direitos reprodutivos seguem em constante ataque, mesmo na pandemia.

Em 2020 a pauta da Legalização do Aborto esteve em evidência, tanto no Brasil quanto no exterior. Aqui, passamos por várias situações de privações de acesso ao aborto, que é permitido em lei nos casos de estupro, risco de vida à mulher e anencefalia do feto.

Em 20 de janeiro de 2020, compartilhamos uma notícia que alertava para o aumento do lobby anti aborto entre deputados estaduais.

Em 26 de março, o maior hospital que presta o serviço de aborto legal em São Paulo, o Pérola Byington, anunciou a interrupção justamente desse serviço em razão da pandemia de Covid-19.
Também em razão da pandemia, foi dificultado o acesso a contraceptivos, mais uma violação dos direitos reprodutivos das mulheres.

Em 20 de julho, uma mulher foi presa ao chegar sangrando em um hospital de Maringá após um aborto. A saúde e a vida das mulheres sendo ignoradas em prol do punitivismo e do controle de nossos corpos.

Em agosto, o triste caso da menina de 10 anos, grávida após constantes estupros perpetrados por seu próprio tio, que teve seu direito ao aborto ameaçado por ataques organizados pelo próprio governo federal e seus apoiadores.

Ainda em agosto, a publicação da Portaria 2282 do Ministério da Saúde, que objetiva impossibilitar na prática o acesso já muito dificultado ao aborto legal, criando mais entraves burocráticos para sua realização, e mais notícias de meninas grávidas após estupros recorrentes de membros da própria família.

Em 02 de setembro, publicamos uma notícia informando de possível aliança anti aborto entre Brasil e EUA. E no dia 16 do mesmo mês, outra notícia informando que na Câmara de Deputados há 83% a mais de projetos visando restringir o aborto nos casos em que já é legalizado.

Em 27 de outubro, a organização Católicas Pelo Direito de Decidir recebeu uma sentença da Justiça de SP proibindo utilizar o termo “Católicas” no nome, cabendo recurso. Demonstrando perseguição a entidades pró-escolha.

Também foi publicado o Decreto 10.531/2020, que, entre outras coisas, tem como objetivo promover os direitos do nascituro.

Com isso, é visivel que os grupos chamados de “pró-vida” (de quem?) estão cada vez mais organizados no Brasil, principalmente com o apoio do governo federal e de instituições religiosas milionárias, e que devemos seguir resistindo, nos organizando e nos unindo, agora mais do que nunca.

Apesar da difícil trajetória que traçamos no Brasil, temos agora um sopro de esperança vindo das nossas irmãs argentinas, que conseguiram, após anos de luta e engajamento, a Descriminalização do Aborto! Esse passo, antes visto como intransponível, foi dado no país vizinho, mesmo enfrentando uma grave crise econômica.

A vitória argentina significa que nós brasileiras não devemos jamais desistir de buscar a descriminalização e legalização do aborto, em todos os casos, aqui no Brasil, mesmo com todos os obstáculos impostos.

A nossa pauta não pode mais ser vista como secundária ou complementar, mas sim deve se transformar em pauta primária, não só do movimento feminista, como também da esquerda em geral, especialmente porque a proibição do aborto reverbera em todos os aspectos da opressão sofridas pelas mulheres: violência contra a mulher; pobreza; discriminação no mercado de trabalho, entre outras formas de subjugação feminina.

Por isso, agora é um momento crucial para nós, feministas, priorizarmos a pauta da Legalização do Aborto e fazermos essa disputa política tão urgente! Convocamos as companheiras a se juntarem a nós para que possamos melhor nos preparar para as batalhas vindouras. Pela vida das meninas e mulheres!

– FrePLA RS, fevereiro 2021

O ano de 2020 por Ação Anti Sexista

Estes são alguns dos artigos publicados pela Ação Anti Sexista durante o ano de 2020. Uma seleção de postagens para você ficar por dentro do que rolou no ano por uma perspectiva feminista. Dividido em categorias apenas pra facilitar do que se trata, sem ser algo fixo.

Textos/Comentários:

Notícia/ Denúncia:

Calendário Feminista:

Entrevista – Parte extra da entrevista com Aline Rodrigues para o documentário Viver Para Lutar:

O ano de 2021 já começa com muitos desafios, que a resistência feminista vença as barreiras impostas pelo patriarcado.

A Vulva Ferida Gigante

Diva- foto: Acervo pessoal

Parte I (embora cronologicamente escrita depois da parte II traz o contexto como introdução para este artigo)

Diva é a vulva gigante esculpida na Usina de Arte que fica no município de Água Preta em Pernambuco. A obra foi sentenciada e a artista atacada tanto pela direita quanto pela esquerda, unidas pela misoginia. A artista plástica Juliana Notari diz que a vulva é também uma ferida aberta representando as violências misóginas. Em mais de uma entrevista a artista conta um pouco da história de Diva. No início dos anos 2000 ela encontrou num ferro velho diversos espéculos ginecológicos de aço, usados por médicos para examinar o colo do útero, e neles estavam gravados o nome da pessoa que os utilizava, a “Dra. Diva”. A artista fez várias performances com estes espéculos, abrindo fendas em formato de vulva em superfícies e lugares diversos, sempre com a conotação de ferida aberta. Ela também utilizava sangue de boi nas performances e depois passou a usar sangue da sua própria menstruação. No último dezembro ela finalizou e publicou nas redes a instalação Diva, a vulva ferida gigante.

Se sucederam os ataques à obra e à artista que foram se multiplicando, parecendo como naquelas brincadeiras de telefone sem fio que no final a frase original já está completamente deturpada, não restando nada do que foi dito inicialmente. Houve uma fabricação de motivos para que se encaixassem em argumentos descabidos em relação a obra. Mesmo mulheres se desassociaram do que também lhes pertence para se juntaram aos homens em inúmeras reclamações. Foi realmente uma ousadia ter escancaradas a céu aberto as mazelas misóginas. Os ataques descortinaram a repugnância tanto pelo órgão feminino em si, como de quem ele tá falando. Não se pode falar de mulheres.

Quando nós feministas apontamos a misoginia presente nos ataques que apareciam de absolutamente tudo que é lado, as pessoas também nos diziam que a obra é ruim. Esta crítica é completamente sem fundamento quando colocada como argumento válido de que isso não nos permite falar da misoginia. Como se o gosto ou a erudição das pessoas em artes plásticas realmente fossem relevantes ou impeditivos para denunciarmos misoginia. A misoginia a gente denuncia em qualquer lugar que ela apareça e isso não precisa nem mesmo significar que estamos defendendo todos os aspectos do alvo em ataque. Além disso muitas coisas que mulheres fazem são colocadas como feministas sem nem mesmo serem, só por terem sido feitas por uma mulher. E as pessoas nos insultam EM VÃO, alegando que achamos isso e aquilo empoderador, quando nós já criticamos o discurso liberal de empoderamento feminino. Vocês estão atrasados no debate e ainda fazem a gente e vocês perderem muito tempo com questões superadas. Todo mundo tem direito a uma opinião, mas nós arriscamos cair no ridículo ao sair por aí falando de coisas que não temos muito ou nenhum conhecimento como se fossemos especialistas. Além disso foi de extrema desonestidade criar suposições com discursos misóginos disfarçados de justiça social.

Doutora Diva 2006 – foto: Acervo pessoal

Parte II (resposta aos ataques publicada na página do facebook em 06.01.2021)

A vulva é parte do corpo de metade da população do mundo, e ainda assim ela causa asco na sociedade. E a gente sabe que é porque existe ódio às mulheres. A vulva jamais é um símbolo de violência, mas é um símbolo de violada, onde se comete violência masculina. E embora aqui eu esteja falando em símbolos, a vulva é uma parte orgânica real do corpo de mulheres, por onde muita opressão e violência acontecem de fato. A “vulva ferida gigante” segundo a artista, é para questionar a sociedade fálica. Como que a sociedade responde? Ficamos enojados com a sua vagina.

A artista posta fotos e dentre elas algumas com os homens que trabalharam na obra. Eu acho que se ela não tivesse postado a foto o pessoal iria pensar que foi ela sozinha que construiu uma instalação de 33 x 16 x 6 metros. É verdade que na maioria das vezes construtores civis são homens negros e que isso é um fato inegável do racismo estrutural. Este apontamento nem por isso desfaz, elimina como passe de mágica em como funciona a misoginia. Existindo ódio às mulheres e desprezo e nojo das “nossas partes”, desprezar essas questões é sim misoginia pura. Como é possível menosprezar o nojo coletivo e o ultraje nacional à vagina e se sair como guerreiro da justiça social?

Nós feministas só estamos dizendo “ei estamos falando de uma vagina/vulva aqui por favor entenda isso não ignore ou desrespeite isso”. As pessoas querem realmente que feministas não enxerguem as reações de ojeriza e desconforto que nossa genitália causa? Vocês podem apontar o racismo estrutural contido na engenharia civil do país mas não podem esperar que a gente se cale diante de todas evidências de misoginia que se sucederam.

Vocês estão cientes de que a vagina/vulva é atacada por diferentes razões em diferentes contextos assim como diferentes tempos na história? Vocês estão cientes que atualmente, neste tempo que estamos agora, não só a imagem, mas só a menção da palavra vagina é considerada transfobia? Tanto é que a escultura também está sendo acusada de excludente porque não inclui “mulheres trans”, e pasmem, acusada de GENITALISMO. E nenhuma pessoa trans tem vagina? Pois é né, essas pessoas que tem vagina não importam.

O que vocês querem de fato de nós mulheres? Que desapareçamos da face da terra carregando nossas genitálias em sacos esterilizados cuidando para que não encostem em nada e de preferência pra bem longe daqui?

Diva – foto: Acervo pessoal

Parte III – A vulva gigante para mim.

Aqui o que digo não tá sendo usado para rebater os ataques, como eu já disse, o gosto não é o que importa, porém minha impressão de alguma forma se relaciona com as reações da sociedade. Isso porque assim como para as pessoas causou asco, e uma necessidade urgente de atacar o que viram, para mim foi o oposto disso. E não me parece que isso tem relação única com estética. Mesmo assim, eu posso dizer que achei impressionante e muito bonita a imagem de uma vulva vermelha a céu aberto no meio de uma montanha. E também inesperada. Sem conseguir decifrar muito bem porquê, eu sorri e tive uma sensação de alegria. Provável que muitas mulheres sentiram parecido. O que eu vi pareceu me conectar com todas as mulheres ao mesmo tempo, possivelmente pela sua dimensão e localização. Não que eu tenha PENSADO assim no momento que vi, mas eu senti assim. As opressões que lutamos para derrubar, acontecem em função da nossa materialidade corporal, somos mulheres, seres humanos que possuem vulvas e que são capazes de gerar. Estas opressões servem para nos suprimir. Uma vulva vermelha gigante no horizonte carrega uma simbologia de territorialidade, de demarcação de um espaço e da impossibilidade de sua invisibilidade. Não tem como não ver.

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Diva – foto: Acervo pessoal

“A vulva, ao longo da história ocidental, sempre foi um tabu. Sempre foi proibido, mutilado, as mulheres em alguns países têm o clítoris arrancado, enquanto, nos chafarizes, há água saindo de pênis esculpidos. É um medo absurdo, porque é um lugar que todo mundo passa, a gente nasce por ela. É por ali que todo ser vivo passa. Mas desperta um medo primitivo, uma repulsa. O medo vem da potência da mulher, a capacidade de gerar e de sangrar todo mês”. – Juliana Notari

O aborto legal é um direito inegociável

Um dia depois do aborto ter sido legalizado na Argentina, me deparei com uma publicação numa página apresentada como feminista, que “alertava” para os “problemas” da legalização do aborto. O texto foi deletado, nele continha uma lista ou pontos sobre “prós e contras” da legalização do aborto. Um dos pontos ou “contras” tratava sobre eugenia. Me pareceu um pouco confuso, mas um dos elementos trazidos fazia uma relação de eugenia com forçar o aborto em mulheres negras, e que para que isso não acontecesse “era de se pensar” se a legalidade era algo realmente bom. Eu li comentários da autora da publicação que traziam esta relação como uma argumentação. E é sobre esta parte que eu achei pertinente comentar. Reitero que independente do que for, o aborto seguro é um direito inquestionável.

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Certo, vamos falar de eugenia então no dia da legalização do aborto na Argentina já que a gente não tem mais nada melhor pra fazer. Já que políticas que objetivam a diminuição da mortalidade de mulheres não devem ser motivos bons o suficiente para comemorarmos.

O aborto é um direito fundamental das mulheres, que nos foi tirado. O aborto não é uma ‘invenção’ moderna, é uma prática utilizada pelas mulheres há milênios. A interrupção da gravidez é um direito das mulheres porque somos nós que temos que lidar tanto com a gravidez quanto com a nossa prole. Dessa forma, o julgamento do que podemos ou não nos engajar, e isso significa engajar nossos corpos e trabalho, é um julgamento que só cabe a nós. Por isso é um direito humano, básico, não cabendo outra pessoa nem as instituições decidirem por nós. Isso não tira o significado de que a luta pela legalização do aborto é uma luta coletiva, muito pelo contrário, já que ela justamente abrange todas e não apenas uma seleção de mulheres. O aborto é um direito das mulheres, de todas as classes sociais, raças e etnias, e por isso é tão importante que seja legalizado, seguro e gratuito, para que o acesso aconteça de fato para todas as mulheres sem distinções.

É importante saber que ao afirmar que a legalização do aborto é eugenia para controlar a população negra e pobre, você está automaticamente colocando as mulheres negras e pobres num lugar específico que você criou na sua mente para elas, e é quase como se você quisesse que elas permanecessem lá. Enquanto você acha que, vamos supor, precisa terminar a faculdade e pra isso não pode manter uma gestação, você retira este direito das mulheres que você já sabe (de forma conformada), que não estão na universidade. Por isso que existem cotas na universidade para pessoas negras, para que elas possam fazer parte dos espaços públicos, para sua subsistência e para participarem de áreas de tomadas de decisões. Uma mulher, uma adolescente, um menina ainda criança, tem que ter o direito ao aborto seguro e gratuito. Pense bem, nem sequer a maternidade vai estar comprometida, porque ela pode vir a ser mãe e várias vezes. Isso nos mostra que até mesmo a maternidade compulsória pode seguir tendo espaço para acontecer.

Certamente que numa sociedade de estrutura racista, o controle da natalidade pode ser promovido para que ocorra em mulheres vulneráveis de menor poder econômico. Mas também é certo que o capitalismo se beneficia com a mão de obra de pessoas negras e pobres, especialmente nos trabalhos mais precários, e que isso também está na estrutura racista. São estruturas a serem combatidas, derrubadas, mas não com o sacrifício de mulheres. Não se pode vulnerabilizar e controlar (ainda mais do que já são), mulheres em situação de pobreza. Para isso portanto é necessário entender que o feminismo não opera nas mesmas regras que o patriarcado e o capitalismo, ambos têm como critério e sustentação negligenciar os interesses e a vida de mulheres. Pensar que um grupo de mulheres tem um direito fundamental negociado, revisado ou relativizado é retirar o direito destas mulheres.

Não é solução questionar a descriminalização e legalização do aborto enquanto milhares de mulheres morrem todos os anos, e quanto mais vulnerável a situação que uma mulher esteja, menos chances ela tem de sobreviver. Todas as mulheres têm que ter garantido o aborto seguro e gratuito. Mulheres vão continuar abortando clandestinamente, arriscando suas vidas e sujeitas a punição se o aborto seguir sendo criminalizado. Simplesmente não é solução negar que seja legalizado algo que é direito das mulheres. Direito humano é direito humano. A ilegalidade do aborto não é o padrão natural e universal. É opressão que controla e explora a capacidade reprodutiva de mulheres.

Aborto Legalizado na Argentina – Vitória Histórica das Hermanas e para Todas Nós

Legalizado o aborto na Argentina. A conquista é fruto de muitos anos de organização e luta feminista. As mulheres argentinas estão de parabéns por toda trajetória de lutas, de muita persistência e coragem. Tantas vezes enfrentaram a derrota ao verem seus projetos de lei sendo barrados na Câmara ou Senado. Aprovado durante a madrugada, acabando com uma era que a cada manhã perpetuava a morte e a criminalização de mulheres. Vitória para todas nós.


Depois de 12 horas de debate a aprovação veio através de 38 votos à favor superando os 29 contra e uma abstenção. O projeto permite que o aborto seja realizado até a 14ª semana de gestação pelo sistema de saúde de forma gratuita e segura. Também será permitido às mulheres interromperem por tempo indeterminado a gravidez decorrente de estupro ou caso a vida da mulher esteja em risco.

É uma conquista alcançada depois de décadas de organização feminista criando estratégias de ação e conscientização.


O aborto é um direito humano das mulheres, fundamental, que nem deveria ser discutido, mas que nos foi tirado.

A vitória das argentinas dá uma esperança e é um exemplo de luta para nós aqui no Brasil. É importante que o feminismo tenha a descriminalização de mulheres e a legalização do aborto como luta central para que tenhamos garantidos os direitos de meninas e mulheres. Embora os ataques aos nossos direitos façam parte de uma política constante, atualmente têm se intensificado no atual governo de administração fascista, misógina e racista. Alguns dos ataques recentes aos direitos reprodutivos das mulheres você pode ler aqui:

Série de violações dos direitos de uma menina de dez anos
Nota técnica do aborto legal como serviço essencial na pandemia é revogada
Pec 29 a desumanização das mulheres
Estatuto do nascituro/bolsa estupro no Ministério da Mulher
Criminalização do aborto já legalizado