Na sua cruzada contra os direitos das mulheres, Bolsonaro pressiona o Ministério da Saúde a desautorizar nota técnica que orientava os estados e municípios a manterem durante a pandemia o acesso a métodos contraceptivos e os serviços de aborto nos casos previstos em lei.
Nas suas redes sociais Bolsonaro postou que “o Ministério da Saúde está buscando identificar a autoria da minuta de portaria apócrifa sobre aborto que circulou hoje na internet”. A ameaça foi concretizada com a exoneração da Coordenadora de Saúde das Mulheres e outro integrante da equipe técnica da Secretaria de Atenção Primária à Saúde. O ministro interino da saúde Eduardo Pazzuelo, que também é general, assinou as exonerações. A postagem também dizia que “O MS segue fielmente a legislação brasileira, bem como não apoia qualquer proposta que vise a legalização do aborto, caso que está afeto ao Congresso”. A nota técnica não falava em legalizar o aborto, mas se referia ao aborto já legalizado no país. Se fosse para seguir “fielmente a legislação brasileira” tal coisa não poderia ser dita, pois é de direito das mulheres e adolescentes terem garantidos esses serviços e o acesso às suas informações. E porque foi elaborada por pessoas que pertenciam a Coordenação de Saúde da Mulher, a nota não pode ser considerada apócrifa.
Trechos da nota:
“Segundo a OMS, as unidades que oferecem serviços de saúde sexual e reprodutiva (SSSR) são consideradas essenciais, e os serviços não devem ser descontinuados durante a pandemia do COVID-19. Tendo em vista a desigualdade social no país, a dificuldade de oferta de alguns serviços de saúde para as populações vulneráveis nos diferentes estados, surge a necessidade de ações equânimes para assegurar o acesso a SSSR de qualidade, com vistas a reduzir a gravidez não planejada e eliminar a violência contra mulher”
“Os fatores relacionados acima têm potencial para impactar diretamente na SSSR das adolescentes e mulheres. Portanto, devem ser considerados como serviços essenciais e ininterruptos a essa população: os serviços de atenção à violência sexual; o acesso à contracepção de emergência; o direito de adolescentes e mulheres à SSSR e abortamento seguro para os casos previstos em Lei; prevenção e tratamento de infecções sexualmente transmissíveis, incluindo diagnóstico e tratamento para HIV/AIDS; e, sobretudo, incluindo a contracepção como uma necessidade essencial”.
“(…) pode-se esperar o aumento de gravidezes indesejadas resultantes de relação sexual forçada. O acesso em tempo oportuno à contracepção de emergência deve ser pensado de modo a responder a esta necessidade das mulheres.” (“Relação sexual forçada” é estupro).
“Todas as mulheres devem ter acesso aos métodos contraceptivos e ao planejamento reprodutivo, principalmente neste período de pandemia.”
Com o aumento de casos de violência contra a mulher durante a pandemia, o acesso a contraceptivos, os serviços de aborto, o atendimento às vítimas de estupro, o tratamento de infecções sexualmente transmissíveis como citadas na nota numa tentativa de assegurá-las, precisam ser de fato serviços essenciais e não podem ser interrompidos durante a pandemia. A decisão de revogar a nota, é um ataque direto contra meninas e mulheres, às nossas vidas e aos nossos direitos.
Bolsonaro e seu governo seguem na sua campanha misógina e de retirada de direitos. E nós mulheres sempre soubemos que isso iria acontecer, nós sabíamos que nossas vidas estavam ameaçadas. Nós sabemos por experiência ancestral que nossas reivindicações são constantemente consideradas de segunda ordem por uns e completamente menosprezadas por outros. Somos criticadas na nossa luta que sempre desagrada, estamos sempre devendo à alguém, e somos esquecidas sistematicamente pela instituição masculinista, até porque ela precisa do nosso sangue para se manter.