Abismo sem fim de absurdos ininterruptos

Cronologia do dilúvio: vamos sucatear para privatizar. Inundação. Agora eles se ferraram a inundação chegou antes, pensou. Não, agora eles vão provar que precisa privatizar. Por quê começaram a falar do Katrina? ‘nossa dizem que é tipo o katrina’. Dois motivos. O Melo contratou empresa de consultoria que atuou naquela tragédia. Finalidade? Talvez isentar a prefeitura de responsabilidade sobre a tragédia e culpabilizar o Dmae – sucateado – para privatizar. Lá nos eua a empresa foi responsável por administração em escolas públicas fazendo alunos pagarem parte das bolsas de estudo. O outro motivo – o Furacão Katrina é a única tragédia que vem na mente de nós povo colonizado que faz vista grossa para cataclismos noutros cantos do mundo.

Seguindo a cronologia da desgraça- bombas de escoamento para fora da cidade não funcionaram, depois só parcialmente, agora depois de quase um mês só 11 das 23 estão funcionando, e nem todas operando fullspeed motorhead! Ponham o lixo na rua para coleta! Com lixo entenda-se vidas das pessoas, pois eram coisas fundamentais ou ganha pão ou alegria de viver! Daí cai A água e “o lixo” entope os bueiros. Na próxima coletiva o prefeito diz que não sabia que horas ia chover!! Nas suas próprias palavras o ‘climatempo’ é falho não deu a hora exata da chuva! Não se desculpa por nada e ainda culpa todo o resto dos profissionais tudo. Daí abre a comporta pra escoar a água. Como a comporta que protege a cidade de enchentes foi aberta? Arrancada como eram os portões medievais por inimigos! Mas nem fechadas completamente estavam. Pra quê fechar? Agora fecha a enchente avançou! Mas a porta sumiu bota saco de areia.

Essa cronologia tá desordenada porque é assim mesmo que aconteceu.Vamos de improviso porque planejamento não é com nós da prefeitura nem do Estado. Improviso é valido pra mim com balde na goteira da sala, não para governantes acharem que podem colocar caminhão do exército encostado na comporta pra ela não voar! Mas cadê caminhão? Não chegou a tempo! Hahaha isso é a definição de rir da desgraça alheia? Vamos reconstruir o Rio Grande dar suporte pras famílias com Auxílio Reconstrução. Não vai dá porque a prefeitura esqueceu de cadastrar os moradores.

Rabisco com hidrocor e esferográfica numa foto de revista que fiz a mais de dez anos atrás. Uma cidade e um abismo profundo. Nem eu poderia imaginar que caberia perfeitamente numa realidade futura. Segue chovendo sem parar em Porto Alegre, alguns bairros completamente alagados sem previsão de quando vai escoar a água. A cidade está devastada. Ruas vazias, cheias de entulhos, lama, peixes mortos, garças nas avenidas comendo os peixes, tartarugas mortas, mal cheiro. Crise sanitária com pessoas ficando doentes. Uma prefeitura e um Governo ineptos.

Sucateamento Privatização Capitalismo neoliberal Negacionismo climático Necropolítica Malcaratismo Incompetência.

[Fazendo um mês da maior tragédia climática do Rio Grande do Sul. Até agora 169 pessoas morreram, 50 estão desaparecidas, mais de 800 feridas. São 2,3 milhões de pessoas afetadas em 471 cidades. Há mais de meio milhão de desalojados. Mais de 82 mil pessoas foram resgatadas e mais de 12 mil animais resgatados.]

Porto Alegre Inundada Porto Alegre Sitiada

Porto Alegre inundada
Porto Alegre sitiada

Os proclamados governantes venderam o que puderam e sucatearam o que ainda não conseguiram vender. O secretário da pasta de proteção à vulnerabilidade social e comunitária pediu exoneração do cargo para uma viagem de férias a Europa em meio a maior enchente da história do estado. Pessoas abandonando suas casas, lutando por sobrevivência, em vulnerabilidade extrema. Ele sai de férias a população fica ilhada. Sem água, sem luz. Muitas dependendo de doações para seguirem vivendo.

Famílias desabrigadas que perderam tudo que se perderam nas águas deixando alguém com saudade e dor.

A enchente alcança o pé da nossa rua e estamos salvos por uma lomba. Me coloco no modo racional diariamente se minha mente vagar começo a pensar que algo pior pode acontecer e a água subir descontroladamente. Faço esse exercício todos os dias para que minha mente mantenha o controle e eu possa cuidar de quem precisa de mim. Não podemos reclamar ao ver ao nosso redor tanta gente em situação que palavras não existem para descrever.

O sistema de bombeamento de água para fora da cidade é de uma tecnologia dos anos 50, 60 e 70, criado depois da última grande enchente de 1941. A enchente de agora a supera. As bombas estão em áreas que alagaram. Precisa-se de uma engenharia atual para realocação dessas bombas. As comportas de contenção de água na cidade estão a 6 anos sem manutenção, o sistema é manual porque a estrutura foi roubada e nunca reposta. Claro que no nível da enchente as comportas não teriam dado conta, mas é um sistema de contenção abandonado. O descaso esta aí pra todo mundo ver.

A bancada ruralista no Congresso Nacional procura reduzir cada vez mais as áreas de proteção ambiental. As matas ciliares que se encontram às margens dos rios têm papel de controle de enchentes mas estão sempre na mira do agronegócio. O governador do Estado flexibilizou regras ambientais ao reformular o Código do Meio Ambiente do RGS favorecendo apenas interesses capitalistas.

Mas a força das pessoas se reafirma a cada dia.
Hoje é o primeiro dia que vimos o recuo da água.
O rio esta baixando, o sol apareceu. A espera continua. Nos vingaremos.

9 de maio 2024 centro histórico de Porto Alegre

[No dia 1º de maio de 2024 começaram as enchentes no Vale do Taquari e região. No dia 2 foi feita a medição do rio Taquari que passou de 30 metros de altura o maior nível registrado da história. Moradores tiveram que sair as pressas de suas casas. No dia 2 Porto Alegre começa a alagar com o rio Guaíba igualmente ultrapassando níveis históricos. O que acontece nos dias que se sucedem é uma enchente sem precedentes que já superou a grande enchente de 1941.]

1º de maio e a divisão sexual do trabalho

No Dia do Trabalhador lembremos que os direitos conquistados no trabalho não são iguais para homens e mulheres.

A divisão sexual do trabalho oferece às mulheres trabalhos mais precários, com salários menores que dos homens mesmo quando as funções são iguais. A divisão sexual do trabalho coloca a mulher na esfera doméstica para um trabalho não remunerado, desvalorizado e considerado uma ‘obrigação feminina’. Tal obrigação não deixa de existir na vida de mulheres trabalhadoras assalariadas sobrecarregadas pela dupla jornada. A divisão sexual do trabalho garante que a prostituição e outras formas de exploração sexual sejam a única ou a mais viável saída que muitas mulheres têm para sobreviver, lhes impossibilitando de fazerem escolhas propriamente ditas.

Toda divisão feita a partir do sexo assegura que as mulheres sejam subordinadas aos homens. Existe uma simbiose muito bem articulada entre o patriarcado e o capitalismo que se sustentam com a exploração do trabalho e dos corpos das mulheres. É importante reconhecer a mulher pertencente a uma classe porque a subordinação é imposta, materializada pelas opressões que atingem todas as mulheres, agravada pela intersecção de opressões.

No dia do Trabalhador lembremos que a força de luta das mulheres por conquistas trabalhistas não seja mais um trabalho a ser utilizado e explorado ao negar às mulheres lutas por conquistas próprias e específicas da nossa classe.

Conformidade e Exploração Não Empoderam Mulheres

O feminismo não é qualquer coisa que passamos a acreditar que ele seja, nem é possível adaptar o feminismo para que se encaixe nas nossas escolhas pessoais. Ser feminista é uma escolha pessoal (na verdade uma saída para a nossa sobrevivência), porém o inverso não é equivalente – uma escolha pessoal não vira feminista a qualquer custo porque assim desejo. Nomear algo de feminista não o transforma em feminismo, é preciso que este ‘algo’ tenha um comprometimento com a análise feminista que enxerga as estruturas de poder que estão sob domínio dos homens como opressoras de mulheres.

Nessa ótica podemos entender que a maioria do que se fala atualmente sobre empoderamento faz parte deste caminho inverso de tentar transformar comportamentos, conceitos e práticas não feministas e até antifeministas ou misóginas em feminismo.

Os padrões de beleza e comportamento estipulados para as mulheres passaram de estereótipos do gênero feminino a serem questionados para serem vistos como parte do “empoderamento feminino”. É uma forma que é conveniente para a manutenção do status quo pela falsa ideia que cria de que há uma mudança comportamental – pois agora a mulher faz uma “escolha”. Mas quando uma coisa é imposta, mesmo que no âmbito de costumes culturais, não é uma escolha quando respondemos exatamente como nos é esperado, é assim que funciona uma imposição. Os costumes são criados dentro das regras sociais e são desiguais entre os grupos de pessoas.

Desta forma as mulheres continuam sofrendo a mesma imposição de padrões mas são incentivadas a acreditar que são “agentes” “criadoras” “independentes”(mesmo que paguem caro para atingir esta “independência”: cirurgias plásticas, cosméticos, etc.). Isso gera também uma conformidade nas mulheres quanto a sua aceitação na sociedade. Antes era possível concluir que para ser aceita tinha que se perseguir esses padrões impostos, agora se estes viram “empoderamento”, não há mais a necessidade de questioná-los e muito menos mudá-los. Tanto o patriarcado quanto o capitalismo são agraciados quando não há oposição ao papel estipulado que as mulheres tem de cumprir na sociedade e quando se garante um público de consumo.

Com isso não se está dizendo que nós mulheres ao respondermos afirmativamente as pressões sociais ou ao adotarmos estes padrões deixamos de ser feministas, mas apenas que nossas atitudes não são automaticamente feministas por sermos mulheres, e que responder as imposições e padrões de beleza estipulados para nós mulheres como é esperado, não pode ser tido como empoderador.

Assim como a imposição dos padrões de beleza e de comportamento estão sendo dadas como “empoderamento” também a exploração sexual passa a ser vista como tal. Os defensores da prostituição e pornografia descobriram no mesmo argumento de “empoderamento” uma maneira que visa manter as mulheres escravizadas mas com sua aceitação, pois tira-se o “escravizada” e coloca-se “empoderada” e você terá mulheres conformadas a serem exploradas. Pelo menos este é o objetivo, o que não significa dizer que é alcançado (a aceitação e conformidade verdadeiras), pois dizer que as mulheres na prostituição e ponografia estão conformadas seria culpabilizá-las em alguma instância, na verdade essa “aceitação” e conformidade são resultados diretos da falta de oportunidades para mulheres.

Mas para os defensores da prostituição e pornografia não basta que estas sejam práticas exploratórias de mulheres, é preciso convertê-las em “escolha feminista”. Apropria-se do feminismo e o deturpa até naturalizar a exploração das mulheres para dar credibilidade a indústria do sexo, um negócio que rende bilhões anualmente. Os defensores da prostituição e da pornografia ignoram completamente a desigualdade de oportunidades entre os sexos (muitos não ignoram mas lucram com isso), pois são as mulheres as maiores vítimas da exploração sexual e das violências que lhe são intrínsecas.

A prostituição e a pornografia são violências contra as mulheres criadas pelos homens para que atendam as “necessidades” masculinas. Não tem como as fantasias masculinas (que ainda por cima são fundamentadas na cultura do estupro) se transformarem em “escolha feminista”, isso até subestima nossa compreensão das coisas. Não importa o quanto se faça um esforço em moldá-las, inventar alternativas, ou caracterizá-las como empoderadoras ou subversivas, pois isso são apenas disfarces – a exploração sexual ao ser renomeada não deixa de ser exploração. Tampouco é possível pegar as fantasias masculinas que perduram no sistema patriarcal e transformá-las em fantasias “igualmente” de mulheres, pois aí se esquece que neste sistema as fantasias masculinas são geradas e mantidas com as mulheres sendo subjugadas – são justamente a violência e a exploração das mulheres que atendem as fantasias masculinas. Procurar transformá-las como fantasias que se dão “naturalmente” e da mesma forma para ambos os sexos é um equívoco. Por mais que uma mulher possa passar a ter as mesmas fantasias, estas surgiram em algum momento do ponto de vista masculino. Na verdade nós não temos como saber quais são nossas reais fantasias. Embora os homens também tenham suas fantasias determinadas pelo sistema patriarcal, elas são oriundas da misoginia inerente a um sistema que beneficia os homens – são as mulheres que pertencem a classe das pessoas violadas, e isso não é uma fantasia mas uma realidade. Ademais o feminismo não é uma luta pela igualdade, mas pela libertação, que jamais se dará se incorporarmos as mesmas atitudes masculinistas. Só é possível alcançarmos a nossa libertação com a mudança na estrutura deste sistema, o que seria dizer, com a destruição do patriarcado.

Apoiar a pornografia e a prostituição consciente ou não dos processos de exploração inerentes a elas é um impedimento para a nossa libertação, e quando se proclama que é em nome do feminismo acaba-se endossando a misoginia de forma oculta e enganosa, até o ponto onde a exploração seja algo livremente consumível e aceitável sem a interferência do feminismo de fato.

A ideia de que empoderamento seja qualquer coisa que uma mulher faça, e que isso é ser feminista, contribui com o conceito de “vários feminismos”, um conceito que se tornou inquestionável – as pessoas acham que advogar por vários feminismos é uma coisa necessariamente boa e indiscutível (ai de alguém ter uma ideia variada). Como se o feminismo também fosse uma forma de consumo, ele próprio virou “um nicho a ser explorado”. Mas o feminismo não é uma roupa de estação que pode mudar completamente dependendo da moda. Para ser feminismo precisa reconhecer e afirmar que as mulheres fazem parte da classe subordinada e entender o que é subordinação. A libertação das mulheres não é como uma vestimenta ultrapassada, a luta feminista não está “desatualizada” porque “hoje em dia as coisas estão diferentes e diversificadas e o feminismo precisa se diversificar”. Não existe nada que “diversifique” a exploração das mulheres suficientemente ao ponto de que a exploração vire um hobby (pelo menos não para as mulheres). Obviamente que o feminismo não é uma coisa estática e homogênea, mas para ser feminismo ele não pode se utilizar da exploração, opressão, violência e discriminação das mulheres como bandeira pró feminista. Além disso, a reivindicação de “vários feminismos” surge muito frequentemente como tática para silenciar feministas, porque se presume que esta reivindicação é inclusiva, portanto correta. A inclusividade é outro conceito praticamente proibido de se questionar, a menos que as excluídas sejam mulheres de grupos sociais que não merecem a mesma atenção, ou feministas radicais (constantemente julgadas como desprezíveis por conta da teoria que defendem).

O feminismo ao pontuar que o empoderamento não se dá pela nossa conformidade aos padrões de beleza e comportamento impostos a nós nem através da exploração do nosso sexo, jamais almeja aumentar a carga nos ombros das mulheres. A análise não visa culpabilizar as mulheres da opressão que enfrentam, pelo menos não como uma classe que se beneficia disso, essa é uma interpretação que tem o intuito de nos dividir e de aliviar a responsabilidade dos homens. A crítica é ao domínio dos homens e a opressão que se estabelece que atinge todas as mulheres.

O feminismo vai seguir sendo a luta contra as estruturas de poder que colocam as mulheres na situação de subalternas dos homens em qualquer esfera. Até que sejamos todas livres de toda e qualquer exploração.

 

aline rod.

As pessoas costumam dizer que uma mulher depois dos seus 40 anos heterossexual que não é casada, está sozinha porque agora a ‘idade fala’ numa sociedade patriarcal. Isso é verdade também, porém é um lado apenas da moeda, e de um ponto de vista externo – da atitude dos homens em relação às mulheres. Uma mulher depois dos seus 40 anos heterossexual pode estar sozinha porque ela se tornou mais seletiva e por não ver nenhum homem que valha a pena. Além disso as mulheres não precisam estarem acompanhadas.

Por outro lado, ninguém se preocupa com as mulheres que estão casadas e querem ficar sozinhas. Sendo muitas mortas quando tentam bom lembrar.

Também me faz pensar que ninguém coloca como ‘empoderamento’ o fato desta mulher estar sozinha. Não se pensa em atitudes como esta como ‘empoderamento’ mas produtos femininos sim. É fácil escrutinar uma sociedade misógina capitalista.

aline rod