Tradução livre Ação Anti Sexista
Tag: violência masculina
A Nova Pasta Mulher e o Antigo Ataque aos Nossos Direitos
A futura ministra da nova pasta Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, diz que o Estatuto do Nascituro será prioridade no ministério que comandará no governo de Bolsonaro. O Estatuto do Nascituro proposto em 2007 pelos deputados Osmânio Pereira e Elimar Máximo Damasceno, não permite o aborto sobre nenhuma circunstância. (Atualmente, a interrupção da gravidez é permitida no Brasil em caso de risco de vida da mãe, gestação causada por estupro e quando o feto é anencéfalo). Integrada ao texto do Estatuto do Nascituro, está a proposta de que a vítima de estupro receba um pagamento de uma bolsa custeada pelo estuprador ou pelo governo quando o agressor não for identificado. Em 2013, na última votação do projeto, ele foi apelidado de “bolsa estupro”, porque é exatamente o que esta proposta significa. É um ataque aos direitos das mulheres.
É um tipo de legalização para o estupro, porque aceita que o estupro existe e cria uma “saída” para que o controle reprodutivo sobre as mulheres não seja ameaçado. Mas por quê não se aceita que o aborto existe? Já que as mulheres abortam por quê não criar condições humanas básicas para as mulheres? Se a resposta é “porque o aborto é crime”, e o estupro não é? Os homens estupram, mas as mulheres não podem abortar. A ideia de uma “bolsa estupro” dá continuidade a violência contra às mulheres. É a misoginia em toda sua perversidade. As mulheres são estupradas sem distinção de classe social, cultura ou raça. Da mesma forma os homens que estupram não se enquadram numa categoria única de classe social, cultura ou raça. Isso é a supremacia masculina, e para que ela se mantenha é preciso aliviar a culpa dos homens controlando e punindo as mulheres.
As mulheres já são punidas por abortarem no Brasil, muitas vezes até mesmo nos casos previstos em lei enfrentam dificuldades, e com o Estatuto do Nascituro a punição se estenderia à obrigatoriedade de levar uma gravidez decorrente de uma violência brutal e traumática. A punição se daria de formas que nem podemos imaginar, parlamentares contrários ao projeto, já alertaram que a medida muito provavelmente forçaria a mulher estuprada a um tipo de relação com seu estuprador para o resto da vida. O que seria extremamente nocivo para a saúde psicológica da mulher, e novamente, de formas que não conseguimos imaginar, pois é impossível abarcar todas as consequências que obviamente fogem de um sistema pragmático ou de algum protocolo.
É um retrocesso que trava ainda mais a luta pela descriminalização do aborto encabeçada há várias décadas por mulheres de gerações anteriores. A punição com a ilegalidade do aborto está na criminalização das mulheres, na ausência de atendimento e de políticas públicas de saúde, deixando as mulheres sozinhas para resolverem a interrupção da gravidez arriscando suas vidas, ou a se tornarem criminosas podendo serem presas. A punição está nas sequelas físicas dos procedimentos precários dos abortos clandestinos. A punição é de morte para milhares de mulheres que não sobrevivem ao aborto. A punição é psicológica causando consequências que podem durar uma vida toda, pelas dificuldades enfrentadas geralmente de forma solitária, por sentimentos de culpa gerados pela própria criminalização e pelos conceitos de moralidade que permeiam a questão. Enquanto estamos lutando para vencermos este quadro já cruel e que nega a nós mulheres nossos direitos humanos básicos, esses projetos sustentados pelo fundamentalismo religioso e pela misoginia, impedem nossos avanços a essas conquistas.
Milhares de mulheres abortam todos os dias no país. As mulheres não vão deixar de abortar por causa de uma pensão. Uma gravidez decorrente de um estupro é um trauma gigantesco, não pode ser reduzido a um problema meramente econômico. É também de uma insinceridade social e política tamanha criminalizar o aborto, pois só se pode proibir o aborto legal, seguro e gratuito, mas não é possível impedir que mulheres busquem meios para interromper a gravidez.
Ainda se faz relevante ressaltar que a própria Damares Alves foi vítima de violência sexual, ela conta que dos 6 aos 8 anos foi estuprada e abusada por dois pastores, homens muito próximos que frequentavam sua casa. Esta parte é um tanto delicada e tem dividido as pessoas que se solidarizam com a sua história entre as pessoas que dizem que isso pouco importa. Dizer que as violências que ela passou pouco importam é uma simplificação e até mesmo uma ingenuidade, e é também inevitavelmente a falta de entendimento sobre como funciona a misoginia estrutural e os processos psicológicos decorrentes de abusos sexuais. É possível compreender o que ela passou quando criança, sem se deixar levar pela sua política conservadora e arbitrária. É possível reconhecer seu sofrimento e manter uma postura crítica e combatente aos programas apresentados por ela no governo que fará parte. E aí entra a questão da ingenuidade em simplificar às críticas colocando em termos de que pouco importa que foi abusada. Pois este fato é justamente utilizado para legitimar as propostas do governo de Bolsonaro. É muito comum este tipo de jogada, de manipulação na política. O simples fato de colocar uma mulher na pasta Mulher, que vai priorizar a proibição do aborto em qualquer circunstância, é uma tentativa de silenciamento às críticas contra esta que é uma supressão dos direitos das mulheres. Mas ao ocupar cargo de tal relevância e autoridade, nem Damares Alves nem o governo que atuará, poderão de forma incólume se utilizar dos abusos que ela foi vítima para vitimizar mais mulheres através de propostas de um governo que se estabelece num discurso retrógrado e que tem orgulho disso. Nós estaremos firmes para fazer oposição ao governo e a propostas como estas, e principalmente nós estaremos firmes lutando para que as mulheres tenham em algum momento neste país seus direitos garantidos e a dignidade que merecem. Milhões de nós não tivemos ou não teremos, mas nos manteremos fortes e principalmente constantes na luta pelos nossos direitos e pelos de todas aquelas que virão.
Mulheres Denunciam Abusos Sexuais Cometidos Por “Guru Espiritual”
Mulheres denunciam abusos sexuais cometidos pelo homem que se alega médium João Teixeira de Faria, conhecido como João de Deus. Os relatos são pesados porque assim é uma violência sexual. Quando a violência sexual é praticada por gurus espirituais ela tem uma característica em comum – a vítima é levada a acreditar que os abusos são parte da “cura” que lhes é prometida. A vulnerabilidade neste contexto é gigantesca, pois a pessoa já está numa situação de fragilidade emocional. Os relatos mostram com muita clareza a manipulação, coerção e as ameaças enfrentadas por essas mulheres por parte deste homem. Em um dos relatos me chamou a atenção o fato de uma delas dizer que as pessoas ao entrarem na sala que ela estava junto ao João Teixeira, a olhavam com “sorrisinhos de canto”. Achei esta parte especialmente cruel, pelo fato de que ninguém pensou em tirá-la dali, ao invés de pensarem que uma mulher estava sendo abusada, as pessoas preferiram acreditar que ela estaria supostamente gostando ou concordando com o que acontecia, o que também demonstra que as pessoas, principalmente quem trabalha com ele, sabem o que acontece ali. Isso define bem como é a violência dos homens contra às mulheres, os homens são justificados e perdoados enquanto nós mulheres somos responsabilizadas e culpabilizadas pelas violências que os homens perpetram contra nós.
As denúncias, apenas mencionadas aqui na página, foram feitas num programa de televisão apresentado ontem à noite, e estão sendo repercutidas em diferentes plataformas de fácil acesso.
Dia Internacional da Não Violência Contra à Mulher – [Sobre a Violência Sexual]
Em 2017 foram registrados 60.018 casos de estupro no Brasil, isso dá uma média de 164 estupros por dia. Porém sabemos que os dados são subnotificados. Existem muitas razões para isso. As mulheres além de sofrerem violências sexuais, são ameaçadas de mais violências ou morte caso denunciem seus agressores. Muitas mulheres por razões econômicas ou afetivas não podem denunciar nem se afastar de seus agressores. Também é muito frequente que as mulheres sejam acusadas de terem causado ou facilitado a violência. A triste e cruel realidade, é que na maioria das vezes as pessoas questionam as mulheres violentadas, procurando achar justificativas que absolvam os perpetradores enquanto culpabilizam a vítima. Sempre se pergunta do porquê a mulher estava tarde ou sozinha na rua, insinua-se que sua roupa era provocativa, ou que o seu comportamento não foi apropriado. Mas as mulheres são estupradas a qualquer hora do dia, independente de suas roupas ou aparência, por homens estranhos ou conhecidos. Todos estes questionamentos demonstram de forma bem definida em como funciona a opressão do patriarcado. Enquanto as mulheres são questionadas e culpabilizadas, os homens são perdoados pelas violências que eles cometem. É comum dizerem “ela estava muito bêbada e pediu por isso”, “sabia que isso aconteceria”, enquanto o agressor é desculpado exatamente pela mesma razão, “ele estava muito bêbado não sabia o que estava fazendo”. Lembrando ainda que os homens podem beber e se comportar como quiserem sem que exista esta ameaça, sem que seus corpos e integridade sejam atacados como os nossos, lhes concedendo uma liberdade muito maior de ir e vir e de ser.
Uma outra face dessa realidade, nem sempre lembrada, é a de que muitas vezes o estupro e os abusos não são assim considerados. Isso é muito comum entre casais, onde existe uma obrigação da mulher em satisfazer qualquer vontade de seu cônjuge, porque a mulher ainda é vista como propriedade do homem.
O estigma e a vergonha também são outras razões que impedem as mulheres de procurar ajuda. Isso é algo que só deixa nós mulheres ainda mais sozinhas para resolvermos o que faremos dali pra frente para não sermos atacadas novamente, contando apenas com nós mesmas para superarmos nossos traumas decorrentes desta violência brutal.
O estupro pode ter consequências físicas como doenças sexualmente transmissíveis, gravidez e traumatismos, ou decorrentes de outras agressões durante o ataque. As consequências psicológicas são imensuráveis e diversas, de fobias, depressão, transtorno pós traumático ao suicídio.
As marcas do estrupo acompanham uma mulher por toda a sua vida.
A culpa da violência sexual nunca é da vítima, mas de quem a comete.
Dia de Combate à Violência Contra à mulher – 25 de Novembro
Hoje estaremos ocupando o espaço público mais uma vez para denunciarmos as violências contra nós mulheres.Também será um espaço para debatermos a ofensiva fascista na atualidade. Haverá uma plenária aberta, estaremos dialogando com as pessoas e entregando panfletos. Algumas organizações e coletivos estarão com suas banquinhas divulgando materiais feministas.
25 de Novembro é Dia de Combate à violência Contra à mulher
Dia Internacional da Não Violência Contra à Mulher – 25 de Novembro
Em 1999, a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) instituiu o 25 de Novembro como o Dia Internacional da Não-Violência Contra à Mulher em homenagem às irmãs Pátria, Minerva e Maria Teresa. Conhecidas como “Las Mariposas”, as irmãs foram brutalmente assassinadas neste dia do ano de 1960 pelo ditador Rafael Leônidas Trujillo, da República Dominicana. As três combatiam fortemente aquela ditadura e, infelizmente, pagaram com a própria vida.
Desde que se instituiu este dia, internacionalmente, movimentos feministas marcam a data para denunciar as violências cotidianas que são cometidas contra as mulheres, com o objetivo de mudar este quadro perverso através de conscientização da sociedade.
Neste ano de 2018 em Porto Alegre, várias organizações, sindicatos, coletivos e mulheres independentes unem as forças promovendo uma plenária para tratarmos sobre as violências e sobre a ofensiva fascista que assola o país. Esta ofensiva se mostrou em discurso e na execução de ataques, causando danos físicos e psicológicos e até mesmo a morte de pessoas pertencentes a minorias ou que levantaram sua voz contra essa pregação do ódio.
Nós mulheres temos estado na linha de frente contra o fascismo e os retrocessos que tentam impor no país com a retirada de direitos alcançados e impedimentos a novas conquistas. Nós bem sabemos o que é termos direitos negados, e as violências contra nós tem muitas faces.
O número de feminicídios cresce no Brasil, em relação a 2016 o ano de 2017 teve um aumento de 6,5 % de mulheres assassinadas, chegando a uma média de 12 mulheres assassinadas por dia, ou, a cada duas horas uma mulher é assassinada no país.
Lembrando que os dados são subnotificados. Houve um aumento de 54% de violências contra mulheres negras registrados entre os anos de 2003 e 2013 – as mulheres negras são as mais atingidas pelas violências. Nós mulheres somos vítimas da violência misógina em todas suas nuances e as mulheres lésbicas sofrem violências específicas. Segundo estatísticas as mulheres brancas não feminilizadas são as mais assassinadas 39%, seguidas das negras não feminilizadas 28% , negras feminilizadas 17%, brancas feminilizadas 15% e mulheres indígenas feminilizadas 1%. Também observa-se um maior número de lesbocídios entre as mais jovens entre 20 e 24 anos, seguidas das meninas até seus 19 anos.
A violência doméstica têm números assustadores e as mulheres são assassinadas por maridos, namorados ou familiares.
No ano passado foram registrados 60.018 casos de estupro, isso dá uma média de 164 estupros por dia. A violência obstétrica também tem números alarmantes e 1 a cada 4 mulheres já sofreu violência no parto. É estarrecedora a ausência de anestesias às mulheres negras.
São muitas as violências cometidas contra as mulheres, esses são alguns dados da nossa realidade aterradora. Ainda existem mulheres invisíveis. Rostos não vistos e vozes não ouvidas. Assim é com as mulheres indígenas e dos povos rons, sinti e calons (o que é conhecido como povo cigano). No Brasil a violência sobre elas é alarmante conforme seus relatos.
Nós mulheres sempre resistimos e assim seguiremos, porque a nossa luta é por uma sociedade justa e de direitos iguais a todas e todos.
Juntas somos mais fortes!
O machismo mata.
O feminismo não mata.
#EPelaVidaDasMulheres
#NenhumaAMenos
#MulheresContraOFascismo
#FeminismoERevolucao
Frente Pela Legalização do Aborto – RS
Chegamos no Dia Internacional da Mulher
Chegamos no Dia Internacional da Mulher
sem que saibam o que é ser uma
sem que saibam de onde vem nossa opressão
outros protagonistas mais uma presunção
chegamos no dia internacional da mulher
e não querem saber como chegamos aqui
nem como sobreviveram nossas antepassadas
terem nos gerado é irrelevância
melhor quando esquecidas na sua insignificância
chegamos no dia internacional da mulher
o que fizeram não pode ser lembrado
e antes que o conhecimento seja repassado
deem um jeito dele junto ao corpo ficar soterrado
chegamos no dia internacional da mulher
nosso engenho é renegado
nosso sangue é derramado
nosso útero é desprezado
mas tem valor para ser alugado
chegamos no dia internacional da mulher
e ser mulher é uma roupa
ou fetiche
uma sensação matinal
que pode mudar no meio da tarde
ao estender uma roupa de baixo no varal
chegamos no dia internacional da mulher
e nosso corpo é tabu
é “biologia terf”
é biomedicina
é experimento
é xyz com vitamina
chegamos no dia internacional da mulher
e eles são comemorados
e o homem neste dia é situado
para garantir que ele sempre seja o primeiro colocado
chegamos no dia internacional da mulher
e nosso futuro é incerto
nossa esperança é abalada
mas quem se importa com gente desatualizada
chegamos no dia internacional da mulher
e a mais antiga opressão chamam de profissão
é capital é diversão
o poder tá na mão
o prazer está na exploração
chegamos no dia internacional da mulher
ela tá tentando escapar mas ninguém a nota
a quem interessa afinal
é só mais uma mulher morta
chegamos no dia internacional da mulher
o dia da arca de noé não esqueçam
é dia de salvar todas espécies que apareçam
porque afinal hoje é o dia de quem quiser
aline rod
Conformidade e Exploração Não Empoderam Mulheres
O feminismo não é qualquer coisa que passamos a acreditar que ele seja, nem é possível adaptar o feminismo para que se encaixe nas nossas escolhas pessoais. Ser feminista é uma escolha pessoal (na verdade uma saída para a nossa sobrevivência), porém o inverso não é equivalente – uma escolha pessoal não vira feminista a qualquer custo porque assim desejo. Nomear algo de feminista não o transforma em feminismo, é preciso que este ‘algo’ tenha um comprometimento com a análise feminista que enxerga as estruturas de poder que estão sob domínio dos homens como opressoras de mulheres.
Nessa ótica podemos entender que a maioria do que se fala atualmente sobre empoderamento faz parte deste caminho inverso de tentar transformar comportamentos, conceitos e práticas não feministas e até antifeministas ou misóginas em feminismo.
Os padrões de beleza e comportamento estipulados para as mulheres passaram de estereótipos do gênero feminino a serem questionados para serem vistos como parte do “empoderamento feminino”. É uma forma que é conveniente para a manutenção do status quo pela falsa ideia que cria de que há uma mudança comportamental – pois agora a mulher faz uma “escolha”. Mas quando uma coisa é imposta, mesmo que no âmbito de costumes culturais, não é uma escolha quando respondemos exatamente como nos é esperado, é assim que funciona uma imposição. Os costumes são criados dentro das regras sociais e são desiguais entre os grupos de pessoas.
Desta forma as mulheres continuam sofrendo a mesma imposição de padrões mas são incentivadas a acreditar que são “agentes” “criadoras” “independentes”(mesmo que paguem caro para atingir esta “independência”: cirurgias plásticas, cosméticos, etc.). Isso gera também uma conformidade nas mulheres quanto a sua aceitação na sociedade. Antes era possível concluir que para ser aceita tinha que se perseguir esses padrões impostos, agora se estes viram “empoderamento”, não há mais a necessidade de questioná-los e muito menos mudá-los. Tanto o patriarcado quanto o capitalismo são agraciados quando não há oposição ao papel estipulado que as mulheres tem de cumprir na sociedade e quando se garante um público de consumo.
Com isso não se está dizendo que nós mulheres ao respondermos afirmativamente as pressões sociais ou ao adotarmos estes padrões deixamos de ser feministas, mas apenas que nossas atitudes não são automaticamente feministas por sermos mulheres, e que responder as imposições e padrões de beleza estipulados para nós mulheres como é esperado, não pode ser tido como empoderador.
Assim como a imposição dos padrões de beleza e de comportamento estão sendo dadas como “empoderamento” também a exploração sexual passa a ser vista como tal. Os defensores da prostituição e pornografia descobriram no mesmo argumento de “empoderamento” uma maneira que visa manter as mulheres escravizadas mas com sua aceitação, pois tira-se o “escravizada” e coloca-se “empoderada” e você terá mulheres conformadas a serem exploradas. Pelo menos este é o objetivo, o que não significa dizer que é alcançado (a aceitação e conformidade verdadeiras), pois dizer que as mulheres na prostituição e ponografia estão conformadas seria culpabilizá-las em alguma instância, na verdade essa “aceitação” e conformidade são resultados diretos da falta de oportunidades para mulheres.
Mas para os defensores da prostituição e pornografia não basta que estas sejam práticas exploratórias de mulheres, é preciso convertê-las em “escolha feminista”. Apropria-se do feminismo e o deturpa até naturalizar a exploração das mulheres para dar credibilidade a indústria do sexo, um negócio que rende bilhões anualmente. Os defensores da prostituição e da pornografia ignoram completamente a desigualdade de oportunidades entre os sexos (muitos não ignoram mas lucram com isso), pois são as mulheres as maiores vítimas da exploração sexual e das violências que lhe são intrínsecas.
A prostituição e a pornografia são violências contra as mulheres criadas pelos homens para que atendam as “necessidades” masculinas. Não tem como as fantasias masculinas (que ainda por cima são fundamentadas na cultura do estupro) se transformarem em “escolha feminista”, isso até subestima nossa compreensão das coisas. Não importa o quanto se faça um esforço em moldá-las, inventar alternativas, ou caracterizá-las como empoderadoras ou subversivas, pois isso são apenas disfarces – a exploração sexual ao ser renomeada não deixa de ser exploração. Tampouco é possível pegar as fantasias masculinas que perduram no sistema patriarcal e transformá-las em fantasias “igualmente” de mulheres, pois aí se esquece que neste sistema as fantasias masculinas são geradas e mantidas com as mulheres sendo subjugadas – são justamente a violência e a exploração das mulheres que atendem as fantasias masculinas. Procurar transformá-las como fantasias que se dão “naturalmente” e da mesma forma para ambos os sexos é um equívoco. Por mais que uma mulher possa passar a ter as mesmas fantasias, estas surgiram em algum momento do ponto de vista masculino. Na verdade nós não temos como saber quais são nossas reais fantasias. Embora os homens também tenham suas fantasias determinadas pelo sistema patriarcal, elas são oriundas da misoginia inerente a um sistema que beneficia os homens – são as mulheres que pertencem a classe das pessoas violadas, e isso não é uma fantasia mas uma realidade. Ademais o feminismo não é uma luta pela igualdade, mas pela libertação, que jamais se dará se incorporarmos as mesmas atitudes masculinistas. Só é possível alcançarmos a nossa libertação com a mudança na estrutura deste sistema, o que seria dizer, com a destruição do patriarcado.
Apoiar a pornografia e a prostituição consciente ou não dos processos de exploração inerentes a elas é um impedimento para a nossa libertação, e quando se proclama que é em nome do feminismo acaba-se endossando a misoginia de forma oculta e enganosa, até o ponto onde a exploração seja algo livremente consumível e aceitável sem a interferência do feminismo de fato.
A ideia de que empoderamento seja qualquer coisa que uma mulher faça, e que isso é ser feminista, contribui com o conceito de “vários feminismos”, um conceito que se tornou inquestionável – as pessoas acham que advogar por vários feminismos é uma coisa necessariamente boa e indiscutível (ai de alguém ter uma ideia variada). Como se o feminismo também fosse uma forma de consumo, ele próprio virou “um nicho a ser explorado”. Mas o feminismo não é uma roupa de estação que pode mudar completamente dependendo da moda. Para ser feminismo precisa reconhecer e afirmar que as mulheres fazem parte da classe subordinada e entender o que é subordinação. A libertação das mulheres não é como uma vestimenta ultrapassada, a luta feminista não está “desatualizada” porque “hoje em dia as coisas estão diferentes e diversificadas e o feminismo precisa se diversificar”. Não existe nada que “diversifique” a exploração das mulheres suficientemente ao ponto de que a exploração vire um hobby (pelo menos não para as mulheres). Obviamente que o feminismo não é uma coisa estática e homogênea, mas para ser feminismo ele não pode se utilizar da exploração, opressão, violência e discriminação das mulheres como bandeira pró feminista. Além disso, a reivindicação de “vários feminismos” surge muito frequentemente como tática para silenciar feministas, porque se presume que esta reivindicação é inclusiva, portanto correta. A inclusividade é outro conceito praticamente proibido de se questionar, a menos que as excluídas sejam mulheres de grupos sociais que não merecem a mesma atenção, ou feministas radicais (constantemente julgadas como desprezíveis por conta da teoria que defendem).
O feminismo ao pontuar que o empoderamento não se dá pela nossa conformidade aos padrões de beleza e comportamento impostos a nós nem através da exploração do nosso sexo, jamais almeja aumentar a carga nos ombros das mulheres. A análise não visa culpabilizar as mulheres da opressão que enfrentam, pelo menos não como uma classe que se beneficia disso, essa é uma interpretação que tem o intuito de nos dividir e de aliviar a responsabilidade dos homens. A crítica é ao domínio dos homens e a opressão que se estabelece que atinge todas as mulheres.
O feminismo vai seguir sendo a luta contra as estruturas de poder que colocam as mulheres na situação de subalternas dos homens em qualquer esfera. Até que sejamos todas livres de toda e qualquer exploração.
aline rod.
Transativistas Atacam Mulheres em Londres – 13.09.2017
Não importa o quanto transativistas cometam e defendam essa violência ela tem um nome: VIOLÊNCIA MASCULINA MISÓGINA!!
Mulher de 60 anos é agredida por transativistas no Speaker’s Corner em Londres na última quarta feira dia 13. localizado no Hyde Park este era o ponto de encontro para feministas e pessoas interessadas em participarem do evento chamado “O que é Gênero?”. O debate tinha sido primeiramente marcado para acontecer numa biblioteca comunitária em Londres, mas as organizadoras sofreram perseguição e ameaças por transativistas e a biblioteca cancelou o evento um dia antes, dia 12. Porém para seguirem com o evento, foi organizado um outro local, que desta vez foi mantido em segredo para garantir a segurança dos participantes. Apenas o ponto de encontro foi divulgado, dali seguiriam para o novo local.
E então transativistas apareceram no Speaker’s Corner para protestar contra o evento, foi quando, como aparece no vídeo, um transativista chega para agredir uma das mulheres que estavam ali. Logo depois outro começa a dar socos na feminista que desvia para se proteger.
Feministas estão sendo silenciadas e censuradas por serem críticas a noção de gênero. Até quando mulheres terão que sofrer ameaças e agressões? isso que está acontecendo a muito tempo vem sendo abafado pelo medo que as pessoas tem de serem erroneamente acusadas de transfobia por qualquer desacordo que tenham com as teorias de identidade de gênero.
A segurança dos homens para cometerem violências e a culpabilização das mulheres
A invasão dos homens ao espaço e corpos das mulheres é uma violência comum, cotidiana, cometida de várias formas. Na semana passada essa realidade se tornou bastante evidente quando um homem ejaculou no pescoço de uma mulher no ônibus. A gravidade da violência e também por ter sido cometida em espaço público não teve como ser abafada como são outros tipos de violências cometidas contra às mulheres.
Parte mais leve desta realidade, digamos assim, nós todas as mulheres estamos bastante acostumadas a lidar. Pegando apenas a invasão dos homens em transportes públicos eu não saberia contar as vezes que homens invadiram meu espaço ou cometeram abusos. Uma vez um desconhecido tirou o fone do meu ouvido para falar comigo. Eu achei aquilo ultrajante e peguei meu fone de volta e não lhe dei mais ouvidos literalmente. Isso só para ilustrar o direito que os homens se sentem de invadir o espaço das mulheres. Os homens constantemente interrompem mulheres, quando falamos e quando estamos no nosso silêncio. Quando estamos fazendo algo que eles julgam que fazem melhor começam a nos explicar muitas vezes coisas que já sabemos muito bem ou melhor que eles. Quantas vezes vendo a fraqueza dos homens em querer provar um conhecimento sobre algo banal, eu me vi lhes ouvindo apenas por constrangimento alheio. Muito provável que o meu sentimento de “constrangimento alheio” tenha raiz justamente na questão de que nós mulheres somos criadas a sermos compassivas e compreensíveis. A compaixão e a compreensão embora sejam consideradas virtudes para humanos, elas são muito mais uma obrigação para as mulheres do que para os homens. Os homens são mais estimulados a serem “autênticos” e suas ações ásperas são comumente justificadas como “homem de temperamento forte”, “não leva desaforo pra casa”, “um verdadeiro homem”, enquanto nós por reagirmos mesmo quando sem agressividade somos sempre “a louca”, “a histérica”, “a mal amada”.
Eu realmente não saberia dizer quantas vezes fui importunada no ônibus. Aos 13 anos porém eu passei pelo primeiro abuso de grau mais grave no transporte coletivo. Nesta primeira vez eu estava sentada na janela olhando pra rua pensativa como já era meu hábito, aguardando como todo mundo que está ali aguarda – minha parada chegar. Então eu sinto algo na minha vagina. Algo impossível de não sentir, porém devido a total discrepância daquilo que eu sentia com o que me parecia razoável em termos reais – ali no ônibus afinal das contas – eu cheguei a questionar a mim mesma se eu realmente tinha sentido aquilo. Eu não entendia de onde vinha aquilo. Porém eu olhei instintivamente para trás e havia um homem de seus mais de 30 anos, ele me olhava e tinha um sorriso sarcástico no rosto. Eu não soube o que fazer no primeiro momento. Eu soube porém que eu não teria como provar que aquilo tinha acontecido, e me bastou um segundo de observação para saber- o homem colocou a mão no vão do banco, entre o assento e o encosto, como eram os assentos na época, porque ele se achou no direito, e mais que isso- é importante ressaltar – se achou seguro para fazê-lo. Eu passei o resto do percurso elaborando uma estratégia em como eu desceria do ônibus, e se ele descesse atrás de mim? Eu também pensei em mudar de lugar mas eu me senti paralisada, eu julguei que seu eu me levantasse seria confirmar que ele havia me atingido. Muito estranho aquele meu pensamento, eu queria fingir que ele não havia me tocado, mas não por mim, eu queria que ele achasse que não tinha sido bem sucedido, embora eu queria sair correndo dali.
É muito desproporcional que os homens se sintam seguros para cometerem os abusos que cometem, incluindo em espaços públicos, e nós mulheres não nos sentimos seguras para reagir, pedir ajuda ou denunciar os abusos que sofremos. Isso é importante ressaltar. Não estou falando com isso que nós mulheres não reagimos, estou falando que é desproporcional a segurança com que os homens sentem de cometer abusos em relação a falta de segurança que temos e sentimos para reagir aos abusos. Isso é parte da guerra não declarada contra nós mulheres e que estamos “acostumadas”, nos cabendo apenas sobreviver no meio desta guerra da melhor forma que podemos. Muitas de nós não sobrevivem.
Alguns anos depois, lembrando que estou me atendo apenas a violência masculina no transporte público, lá estava eu, novamente num ônibus aguardando a hora de chegar em casa numa noite de segunda feira. Então senta um homem ao meu lado. Como era noite e eu olhava pela janela, foi possível pelo reflexo do vidro ver uma movimentação estranha vindo do homem. O braço dele mexia sem parar porém estava embaixo de uma pasta. Eu soube na hora o que ele fazia mas eu me senti travada para fazer alguma coisa. Eu novamente não estava preparada para aquilo, eu acho que nunca vou estar completamente, embora com o tempo de vida hoje me sinto bem mais capacitada para agir contra a violência masculina, mas não imune.
As pessoas costumam me considerar autoconfiante, com capacidade de resposta. Mas eu não consegui naquele momento colocar em ação toda essa minha virtude, ou defeito já que como mulher pode ser considerado como tal. Foram inúmeras vezes que já revisitei este episódio tentando entender do porquê eu não ter falado com as pessoas ao meu redor, ou ter chamado a atenção do motorista, ou cobrador. Uma das razões eu lembro, foi de que eu poderia estar cometendo um equívoco já que o que o homem fazia era literalmente por debaixo dos panos. Uma outra razão que eu também encontrei depois de recordar sobre o “ocorrido” foi vergonha. Eu senti vergonha por estar sendo atacada, como se houvesse uma espécie de culpa em mim, como se fosse possível que eu fosse a culpada. A vergonha que eu senti foi uma vergonha por antecipação, é como se eu soubesse que as pessoas me olhariam incrédulas, desconfiadas e ou iam me questionar sobre o que eu tinha feito para aquele homem fazer aquilo.
De certa forma a autoconfiança que eu procurei desde pequena desenvolver apesar de todo bombardeio do patriarcado que nós mulheres recebemos para não desenvolvermos, acho que foi o que me levou naquele dia a julgar que eu poderia me livrar sozinha sem ajuda das pessoas. Então, como da vez do primeiro abuso no ônibus, eu comecei a pensar numa estratégia de como sair daquela “situação”. Eu estava apavorada, mas conseguia raciocinar, eu jogava com o tempo e na verdade precisava que demorasse bastante, que o ônibus parasse em todas paradas possíveis até eu descobrir o que fazer. Eu sabia que principalmente naquelas circunstâncias, eu não poderia descer sozinha na parada de ônibus próxima a minha casa que era um local ermo e sem iluminação pública decente, era noite por volta das 23h. Depois de avaliar bastante, eu encontrei uma possível saída para o meu problema e decidi que era melhor eu descer uns dois quilômetros antes de casa, pois isso se daria numa avenida supostamente mais movimentada e que se caso ele descesse eu teria mais chances de não ser atacada. Para o caminho a percorrer depois até em casa à noite e sozinha, bem essa seria uma nova estratégia a solucionar. Também como parte da minha estratégia, eu pensei em descer só quando o ônibus parasse, ao contrário do comum que é levantar com certa antecedência e puxar a cordinha (que hoje é um botão). Esta estratégia porém era arriscada, pois dependia de que alguém solicitasse parar aonde eu queria ou que alguém solicitasse o ônibus da tal parada. Decidi arriscar. De repente faltavam três paradas para o meu destino – que não era de fato o meu destino final. Como para uma mulher pode ser difícil chegar em casa sob essa realidade, e ela também pode nunca chegar. Fui me preparando psicológica e fisicamente para tanto. Quando a parada chegou eu pulei do assento o mais rápido que pude e contornei as pernas do homem que se masturbava incessantemente, sempre por debaixo da pasta, imaginando que o mesmo não desceria já que não havia se levantado e solicitado a parada, e que teria um pingo de vergonha de mudar de ideia em cima da hora. Eu não sei porque cargas d’água eu pensei que um homem que não tinha vergonha de se masturbar em público pudesse realmente sentir vergonha de qualquer outra coisa. Desci com uma espécie de alívio que durou apenas um segundo pois ao olhar para trás para me verificar da minha segurança, como num filme de horror, ali ele se encontrava, na mesma parada que eu. Ele havia descido do ônibus. Pânico. Isso só me confirmou o que acontecia e os meus medos do que me poderia acontecer. Para minha “sorte” tinham três pessoas na parada e eu fiquei torcendo para que elas ali se mantivessem até eu bolar o plano B. E o homem se manteve igualmente ali aguardando sua presa. Ele me mantinha como refém. Tudo em silêncio. Tudo sozinha. Então uma pessoa pegou o próximo ônibus e dali uns minutos a segunda, quando eu vi que logo a terceira pessoa ia pegar o seu ônibus eu resolvi agir rapidamente, olhei ao meu redor e vi um grupo de pessoas se aproximando, eram três homens, eu então disse olá tudo bem? E comecei a caminhar com aqueles homens, o que não me garantia muita segurança, mas eu não tinha muitas chances. Eu não pensei na época em confrontar fisicamente aquele homem que havia se masturbado no ônibus e pronto para me atacar, além dele ser bem maior do que eu, eu não sabia se ele estava armado, eu tampouco estava interessada em dar-lhe as costas e esperar para que me atacasse. E foi assim que eu me livrei desse homem, os três caras estavam indo para a mesma direção que eu e nos separamos a umas duas quadras antes da minha casa.
Havia porém uma outra razão para eu ter ficado em silêncio durante todo o meu suplício, que nesta narrativa eu escolhi deixar para o final. Eu lembro que eu pensei que se caso eu procurasse ajuda das pessoas no ônibus e caso elas não agissem com indiferença e me fizessem sentir vergonha, que podia acontecer que se desencadeasse o linchamento daquele homem. Parece esquisito eu ter escolhido a integridade física daquele homem em contraponto a minha própria. Mais tarde quando eu já estava segura eu só pensava que ele poderia estar atrás de uma outra mulher e agora eu me sentia culpada perante a esta conclusão.
Vendo que dos últimos casos de violências contras às mulheres das últimas semanas surgiram debates sobre punitivismo eu me lembrei de tudo isso que me aconteceu de todos os detalhes, e me perguntei, de quem e para quem essas pessoas estão falando sobre punitivismo? Quem são as pessoas em grande maioria que além de cometerem as violências primárias costumam cometer crimes de vingança? Pergunto, fora considerar que as denúncias feitas por mulheres contra homens podem talvez se tornarem escrachos e possíveis mas muito improváveis linchamentos o que está sendo feito para parar a violência dos homens? Quais medidas a esquerda tem tomado para acabar com a violência masculina? Nem mesmo acreditar nas mulheres agredidas a esquerda costuma acreditar, são incansáveis as denúncias de abuso que não mudam absolutamente nada na vida do agressor que muito pelo contrário continua andando pelos mesmos cenários que sempre andou. Então esta questão sobre o punitivismo além de tudo o que já foi mencionado é também falha em vários sentidos. Ela parece se alienar da realidade material. As pessoas que estão sendo punidas em primeiro lugar são as mulheres. Não que o debate sobre punitivismo não possa acontecer, mas também ele demonstra a prioridade da preocupação com a segurança dos homens. A misoginia é estrutural, dar menos importância a segurança das mulheres é sua consequência. Dentro de uma perspectiva de debate você sempre pode escolher uma neutralidade, se distanciar para elaborar teorias que podem até fazer sentido, teoricamente, mas que não correspondem com a realidade ou que favorecem os opressores, neste caso a neutralidade pode ter escolhido um lado.
Os homens mantém as mulheres como reféns, o patriarcado e a misoginia inerente a ele, nos atingem diariamente, a nossa rotina pode ser pesada e perigosa, mas nós mulheres somos sempre culpabilizadas, seja por estarmos no “lugar errado”, na hora “inapropriada para uma mulher”, com as roupas “erradas” (ou não), seja por vocalizarmos nosso sofrimento com o preço de sermos as responsáveis pela segurança dos nossos algozes.
aline rod.
A Questão do Desaparecimento – Uma Reflexão Sobre o Apagamento da Lesbianidade – Claire Heuchan
Pelo dia e mês da visibilidade lésbica decidi fazer a tradução deste texto que trata de uma realidade atual das mulheres lésbicas. Que as mulheres lésbicas sejam ouvidas ao mesmo tempo que não silenciadas.
– 29 de agosto dia da visibilidade lésbica –
A Questão do Desaparecimento – Uma Reflexão Sobre o Apagamento da Lesbianidade
-por Claire (Sister Outrider)
Estes são tempos estranhos para ser uma jovem mulher lésbica. Ou melhor, jovial. No tempo que me levou para evoluir de uma inexperiente sapatão caçula em uma completa e formada lésbica, a tensão entre as políticas de identidade do queer e a libertação das mulheres se tornou realmente insuportável. O facebook adicionou reações da bandeira do orgulho gay no mesmo mês que eles começaram a banir mulheres lésbicas por nos descrevermos como butch (algo como sapatão ou caminhão em português). Enquanto a legislação de casamento e o direito de adoção para casais do mesmo sexo se tornam cada vez mais parte da sociedade dominante, o direito de mulheres lésbicas de se auto definirem e declararem seus limites sexuais é comprometido dentro da comunidade LGBT+. Tais contradições são características desta era, mas isso não torna elas mais fáceis de suportar dia após dia.
Amor é amor, a não ser que aconteça de você ser uma mulher lésbica – neste caso sua sexualidade será incansavelmente desconstruída sob suspeita de você estar sendo excludente. Como já escrevi anteriormente, cada sexualidade é por definição excludente. Sexualidade é um conjunto de parâmetros que governa as características que potencialmente nos atraem nas outras pessoas. Para lésbicas, é a presença das características sexuais primárias e secundárias das mulheres que geram (mas não garantem) a possibilidade de atração. O sexo, e não o gênero (nem mesmo a identidade de gênero), é o fator chave. Mas no ponto de vista queer, assim como no da sociedade patriarcal dominante), lésbica é uma designação contestável.
Mulheres lésbicas são encorajadas a se descreverem como queer, um termo tão abrangente e vago que parece ser desprovido de significado específico, pelos motivos de que ninguém que possuí um pênis é tido como inteiramente fora dos nossos limites sexuais. Jocelyn MacDonald coloca muito bem:
“Lésbicas são mulheres, e mulheres são ensinadas que devemos estar disponíveis sexualmente como objetos de consumo público. Então nós despendemos muito tempo dizendo “Não”. Não, nós não vamos transar ou nos relacionar com homens; não, nós não vamos mudar de ideia quanto a isso; não, este corpo não é território masculino. Lésbicas, hetero ou bissexuais, nós mulheres somos punidas sempre que tentamos demarcar limites. O queer sendo um termo genérico torna realmente difícil para lésbicas assegurarem e manterem estes limites, porque se torna impossível nomear estes limites.”
Em tempos em que o reconhecimento do sexo biológico é tratado como um ato de intolerância, a homossexualidade é automaticamente problematizada – as consequências não previstas das políticas identitárias de gênero são enormes e de largo alcance. Ou ainda, seria mais correto dizer, que a sexualidade lésbica virou um problema: a ideia de que nós mulheres direcionemos nossos desejos e energias de uma para outra continua suspeita. De alguma forma, o padrão de homens centrarem homens nas vidas deles nunca recebe o mesmo backlash (reação negativa, resposta em forma de ataque). As lésbicas são uma ameaça ao status quo, seja no heteropatriarcado ou na cultura queer. Quando nós lésbicas rejeitamos a ideia de nos relacionarmos com alguém com pênis, nós somos taxadas de “fetichistas de vaginas” e ginefílicas – Levando em conta que a sexualidade de lésbicas é rotineiramente patologizada no discurso queer, assim como a sexualidade lésbica é patologizada pelo conservadorismo social, não é surpresa para mim que tantas mulheres jovens sucumbam a pressão social e abandonem o termo lésbica em favor do termo queer. O auto apagamento é o preço da aceitação.
“Não é nenhum segredo que o medo e o ódio a homossexuais permeiam nossa sociedade. Mas o desprezo por lésbicas é distinto. É diretamente arraigado no repúdio à autodefinição da mulher, à autodeterminação da mulher, às mulheres que não são controladas pela necessidade, pelo comando ou pela manipulação masculina. O desprezo por lésbicas é mais comumente um repúdio político às mulheres que se organizam em seu próprio benefício em busca de estarem presentes no espaço público, de que sua força seja validada, que sua integridade seja visibilizada.
Os inimigos das mulheres, aqueles que estão determinados a nos negar a liberdade e a dignidade, usam a palavra lésbica para provocar o ódio às mulheres que não se conformam. Este ódio ecoa em toda parte. Este ódio é sustentado e expressado por praticamente todas as instituições. Quando o poder masculino é desafiado, este ódio se intensifica e se inflama de forma a ser volátil, palpável. A ameaça é de que esse ódio pode explodir em violência. A ameaça é onipresente porque a violência contra a mulher é culturalmente aplaudida. E assim a palavra lésbica, gritada ou sussurrada em tom de acusação, é usada para direcionar a hostilidade dos homens contra as mulheres que ousam se rebelar, e é também usada para assustar e intimidar as mulheres que ainda não se rebelaram.” – Andrea Dworkin
A política de identidade queer tende a pensar que mulheres nascidas mulheres se interessarem exclusivamente por outras mulheres é um sinal de intolerância. Não vamos desperdiçar parágrafos com equívocos. Este mundo já tem silenciamentos acerca de gênero mais do que o suficiente, e é invariavelmente as mulheres que pagam o maior preço por estes silenciamentos – neste caso, mulheres que amam outras mulheres. Então eu digo o seguinte: lésbicas negarem categoricamente a possibilidade de se relacionarem com alguém com pênis é tido como transfóbico pela política queer porque não inclui mulheres trans na esfera dos desejos de lésbicas. A lesbofobia inerente na redução da sexualidade lésbica à fonte de validação, obviamente recebe passe livre.
Ainda assim, a sexualidade lésbica não necessariamente exclui pessoas que se identificam como trans. A sexualidade lésbica pode se estender a pessoas que nasceram mulheres que se identificam como não binárias ou queergênero. A sexualidade lésbica pode se estender a pessoas que nasceram mulheres que se identificam como homens trans. Comparando a alta proporção de que homens trans auto identificados viviam como lésbicas butch antes de transicionarem, não é incomum que homens trans façam parte de relacionamentos lésbicos.
Aonde está o limite entre uma lésbica butch e um homem trans? Durante suas reflexões sobre a vida das lésbicas, Roey Thorpe considera que “…invariavelmente alguém pergunta: Aonde todas as butches foram parar? A resposta curta é masculinidade trans (e a resposta longa requer um artigo próprio). Em qual parte dentro do espectro de identidade termina o butch e o trans começa?
O limite é amorfo, embora de forma imaginativa Maggie Nelson tenta traçar em The Argonauts. O parceiro dela, o artista Harry Dodge, é descrito por Nelson como um “butch charmoso em T.” segundo Nelson “qualquer semelhança que eu observe nos meus relacionamentos com mulheres não é a semelhança como Mulher, e certamente não é a semelhança das partes envolvidas. Ao invés disso é a esmagadora compreensão compartilhada do que significa viver no patriarcado.” Dodge é gênero fluido e de aparência masculina. A testosterona e a cirurgia de remoção dos seios não removem a compreensão do seu local neste mundo como mulher. Estas verdades coexistem.
A ideia de que lésbicas são transfóbicas porque os limites da nossa sexualidade não se estendem em acomodar o pênis é uma falácia falocêntrica. E a pressão nas lésbicas para redefinirem esses limites é francamente assustadora – se baseia numa atitude do direito de propriedade sobre os corpos das mulheres, uma atitude que é parte do patriarcado e agora tem sido reproduzida na esfera queer. As mulheres lésbicas não existem para que sejam objetos sexuais ou fontes de validação, mas como seres humanos autodefinidos com desejos e limites próprios.
Conversar sobre a política queer com amigos homens gays da mesma idade que eu é algo revelador. Eu sou lembrada de duas coisas: para os homens, ‘não’ é uma palavra aceita como assunto encerrado. Com mulheres, o não é tratado como uma abertura à negociação. A maioria dos homens gays fica horrorizada ou então surpresa com a noção de que os parâmetros de suas sexualidades possam ou devam mudar de acordo com as imposições da política queer. Alguns (os mais sortudos – a ignorância é uma benção) não estão familiarizados com a fantasiosa teoria queer. Outros (os recentemente inciados) estão, como era de se esperar, resistentes a problematização da homossexualidade do ponto de vista queer. Teve um que chegou a sugerir que gays, lésbicas e bissexuais rompessem com a sopa de letrinhas do alfabeto da política queer e se auto organizassem especificamente em torno das suas sexualidades – dado que as lésbicas estão sendo sujeitas a caça às bruxas TERF (feministas radicais trans excludentes em português) por terem feito a mesma sugestão, foi ao mesmo tempo encorajador e lamentável ouvir de um homem que está fora do feminismo radical dizer a mesma coisa sem medo de ser censurado.
Fico feliz em dizer que nenhum dos homens gays que eu chamo de amigos optaram pelo que pode ser descrito como a lógica de Owen Jones: rejeitar as preocupações das mulheres lésbicas e as tratar como atos de intolerância, numa tentativa de conseguir biscoitos-de-arco-íris da aprovação como aliado trans. A onda de homens de esquerda em lucrarem com a misoginia para consolidar sua reputação é um conto tão antigo quanto o patriarcado. Não é uma grande surpresa que isso aconteça dentro da comunidade queer, já que a cultura queer é dominada por homens.
A comunidade queer definitivamente pode afastar as mulheres lésbicas. Embora eu tenha participado de espaços queer quando eu estava me assumindo, acabei me retirando cada vez mais daquele contexto com o tempo. Eu não sou de forma alguma a única – muitas mulheres lésbicas da minha faixa etária se sentem excluídas e deslocadas nos ambientes queer, lugares que nos dizem que deveríamos pertencer. Não são apenas lésbicas mais velhas que são resistentes a política queer, apesar de que deus sabe o quanto elas nos avisaram sobre a misoginia nela. Meu único arrependimento é não ter ouvido antes – que eu tenha perdido meu tempo e energia tentando conciliar divergências ideológicas entre o queer e o feminismo radical.
O discurso queer se utiliza de uma abordagem coerciva para forçar lésbicas a se conformarem – ou nós acatamos o queer e pertencemos ao grupo, ou nós seremos apenas figuras irrelevantes que estão “por fora” como “as velhas lésbicas chatas”. Esta abordagem, na misógina discriminação pela idade, foi equivocada: eu não consigo imaginar nada que eu quisesse ser mais do que uma lésbica mais velha, e é maravilhoso saber que este é o meu futuro. A influência que tem em mim a profundidade do pensamento das mulheres mais velhas, a forma como elas me desafiam e me guiam no processo de consciência feminista, tem um papel central em formarem tanto a minha noção sobre o mundo como compreender meu lugar nele. Se eu for realmente sortuda, um dia eu terei aquelas conversas elevadas (e as vezes, intelectualmente extenuantes) com as futuras gerações de jovens lésbicas.
Embora eu aprecie o apoio e a sororidade das lésbicas mais velhas (de longe meus seres humanos favoritos), em certos aspectos eu também as invejo pela relativa simplicidade da existência lésbica nos anos 70 e 80. A razão para esta inveja: elas viveram vidas lésbicas num tempo anterior a política queer se tornar dominante. Eu não estou dizendo isso desconsiderando ou implicando que o passado
foi uma utopia para os direitos de gays e lésbicas. Não foi. A(s) geração(ões) deles tiveram a cláusula 28 (“section 28”), cláusula que bania que a homossexualidade fosse considerada nas escolas como relacionamento familiar normal) e a minha tem o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Os avanços que beneficiam minha geração são resultado direto da luta deles. Ainda assim as lésbicas podiam viver pelo menos parte de suas vidas numa época em que de todas as razões pelas quais a palavra lésbica foi encarada com desgosto, ser considerada “demasiado excludente” não era uma delas. Não houve um ímpeto, dentro de um contexto feminista ou gay, tornar a sexualidade lésbica esquisita (“queer” em inglês, a autora aqui faz um trocadilho).
Algumas coisas não mudaram muito. A sexualidade lésbica é comumente degradada. As mulheres lésbicas ainda estão nas campanhas lésbicas do “Não se preocupe, eu não sou aquele tipo de feminista.” Só que agora, quando eu checo as minhas notificações no Twitter, realmente levo um tempo para descobrir se minha lesbianidade ofendeu a “alt-right” (nova denominação da extrema direita) ou da esquerda queer. Isso faz alguma diferença? A lesbofobia tem o mesmo formato. O ódio às mulheres é o mesmo.
Durante a Parada Gay, uma foto de uma mulher trans sorridente vestindo uma camiseta manchada de sangue dizendo “eu soco as TERFs” circulou nas redes sociais. A imagem tinha a seguinte legenda “isso é como a libertação gay se parece”. Aquelas de nós que vivem na intersecção entre a identidade gay e a mulheridade – lésbicas- são frequentemente taxadas de TERFs puramente pelo fato de que nossa sexualidade torna esta reivindicação dúbia. Considerando que vivemos num mundo onde uma a cada três mulheres sofre violência física ou sexual durante sua vida, eu não me surpreendo– não tem nada de revolucionário ou contracultural em fazer uma piada sobre bater em mulheres. A violência contra as mulheres foi glorificada sem pensar duas vezes, colocada como um objetivo de políticas libertárias. E nós todos sabemos que TERFs são mulheres, já que homens que definem limites são raramente sujeitos a tais ataques. Apontar a misoginia obviamente resulta numa nova enxurrada de misoginia.
Existe uma réplica preferida reservada para as feministas que criticam as políticas sexuais da identidade de gênero, uma resposta certamente associada mais com adolescentes meninos do que qualquer política de resistência: “chupe meu pau de garota”. Ou, se a maldade se junta com uma tentativa de originalidade, “engasgue com meu pau de garota”. Ouvir “engasgue com meu pau de garota” não parece nada diferente de ouvir te dizerem que engasgue num pau de qualquer tipo, mesmo assim isso se tornou já quase uma parte da rotina do discurso de gênero que se abriu no Twitter. O ato permanece o mesmo. A misoginia permanece a mesma. E isso está dizendo que neste cenário a gratificação sexual é derivada de um ato que muito literalmente silencia as mulheres.
Uma frase icônica de Shakespeare em Romeu e Julieta proclama que “uma rosa com qualquer outro nome teria um aroma igualmente doce.” Com isso em mente (por existir muito mais tragédia do que romance sobre esta situação), eu diria que independente do nome um pênis iria repelir sexualmente as lésbicas. E isso é ok. O desinteresse sexual não é a mesma coisa que a discriminação, a opressão ou a marginalização. Porém, sentir que a sexualidade é um direito que se tem sobre alguém é : ele é parte fundamental da opressão das mulheres, e se manifesta claramente na cultura do estupro. Dentro da concepção queer não há espaço dedicado para discussões sobre a misoginia que possibilita o se sentir no direito de ter acesso sexual aos corpos de mulheres. Simplesmente reconhecer que o assunto existe é considerado inaceitável, e como resultado, temos a misoginia protegida por camadas e camadas de silêncio.
Esta não é uma época radiante para se ser uma lésbica. A falta de vontade das políticas queer para simplesmente aceitar a sexualidade lésbica como válida por direito é profundamente desamparadora, ao ponto de se privilegiar o desejo de ter sexo sobre o direito de recusa ao sexo. E mesmo assim a conexão lésbica persiste, como sempre persistiu. Os relacionamentos lésbicos seguem florescendo enquanto oferecem uma alternativa radical ao heteropatriarcado – só porque não é particularmente visível agora, apenas por não ter o apelo dominante (isto é, patriarcal) que tem a cultura queer, não significa que não esteja acontecendo. As lésbicas estão em toda a parte – isso não vai mudar.
Nolite te bastardes carborundorum.
Claire
traduzido por Ação Antisexista
original aqui
https://sisteroutrider.wordpress.com/2017/07/01/the-vanishing-point-a-reflection-upon-lesbian-erasure/amp/
Além de sofrermos abusos, nos querem caladas – sobre as denúncias de abusos de homens contra as mulheres no meio musical
Nas últimas semanas surgiram denúncias de abuso por parte de homens de diferentes bandas, e com isso se iniciou um debate nas “redes sociais”. Como de costume, os debates são rasos, as pessoas sem um mínimo de entendimento das consequências que os abusos causam nas mulheres passaram a questionar a veracidade dos fatos e as mulheres abusadas, bem como apesar de uma total falta de compreensão sobre o feminismo, direcionaram suas opiniões sobre feministas provocando o silenciamento por parte de muitas mulheres e críticas àquelas que ousam confrontar a dominação masculina.
segue o texto publicado por lá.
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Além dos abusos que nós mulheres sofremos, nos querem caladas, o abuso não pode ser revelado, tem que se manter como um segredo ou alguma coisa suja que não pode manchar esta ou aquela cena, o ambiente, a família, as amizades. Mas que amizades seriam exatamente as que não se preocupam com a nossa integridade física e emocional? Que só ficam contentes com a gente quando concordamos com seguirmos sendo oprimidas em silêncio? Qual a finalidade de perante uma denúncia desviar o assunto e diluir a gravidade das consequências dos abusos cometidos contra uma mulher? Diluir o assunto com o intuito de salvar a pele dos homens em detrimento de machucar as mulheres? Diluir o assunto para dividir as mulheres entre si? Por que é mais importante a preocupação com o emprego dos homens, com a carreira deles, com o seu status, do que com o corpo e o psicológico das mulheres? E seus traumas? E com a carreira delas? (sim muitas mulheres perdem o emprego quando sofrem abuso, não podem trabalhar porque o ‘parceiro’ não deixa entre outras causas). E só um pouco aí, quantas de nós mulheres que estão na música temos que incessantemente por anos a fio provar a nossa competência, ou talento, ou só o direito de estarmos ali com ou sem talento mesmo? O que significa que no meio de uma denúncia de abuso as pessoas acham mais “adequado”, mais urgente e relevante falar que “as vezes é possível que as denúncias sejam irresponsáveis”? Qual a finalidade de elaborar palavras que apenas servem como uma ótima justificativa e salvação para homens abusivos?
O que leva uma pessoa a achar o que ela julga irresponsável (e aí teríamos ainda que partir do princípio que seu julgamento é correto) causa mais danos do que a própria violência cometida? Isso só demonstra quem está em primeiro lugar e só corrobora com o porquê de continuarmos resistindo.
O que eu vi aqui foi que no meio de uma denúncia e de um debate que podia trazer mais solidariedade com as mulheres e entre elas mesmas, foi mais importante ressalvar que o orgulho dos homens não pode ser ferido sobre hipótese alguma, antes uma mulher abusada, do que um orgulho de homem machucado. E quanto carreira e sustentabilidade, pois somos nós mulheres em comparação aos homens que pertencemos a classe que recebe menos pelos mesmos serviços prestados, que criamos filhos sozinhas, que não conseguimos ou perdemos emprego por estarmos grávidas ou por termos filhos pequenos, e comumente porque nossa capacidade é questionada e é preferível colocar um homem no posto. Muito ruim as posições que li aqui, homens sendo acusados de abuso ou suas bandas e ao invés de se retratarem (perderam a chance) procuraram sem nenhum constrangimento usarem do momento para salvarem a pele de uma forma muito oportunista e ainda por cima sobre o sofrimento de mulheres abusadas. É possível que se acredite que nós não sabemos o que nos acontece com nós mesmas e que palavras incoerentes e que não condizem com a realidade vão entrar na cabeça de todas as mulheres e que o feminismo vai sumir? Não, o feminismo não vai sumir, o que precisa sumir antes disso é a opressão e exploração cometida contra as mulheres. Por quê não se começa primeiro apontando a opressão e se solidarizando ao invés de apontar os possíveis erros cometidos por mulheres abusadas? E quais erros essas mulheres realmente cometeram? Procurar apoio? Se sentirem mais dignas e quem sabe com sorte menos sozinhas? E elas tem que serem perfeitas?
O que de fato se sente quanto uma mulher retira uma denúncia? alívio? E alívio pelo que exatamente? Porque se estava preocupado com a saúde da moça ou porque agora a sua banda pode seguir de vento em popa? Alguém cavoca se é verdade mesmo que não aconteceu nada agora? Alguém pede agora provas de que o que não aconteceu não aconteceu mesmo?
Vocês sabem porque mulheres voltam atrás nas denúncias de violência? Vocês se sentem bem se eu disser que esse modus operandi visto aqui contribui para isso? E consequentemente com mais violência contra a mulher? Que ser paternalista e elogiar mulheres por se comportarem como “preferível” contribui para o silenciamento de mulheres? E para que sofram mais violências?
O desconforto que debates assim podem causar não pode ser mais importante que a segurança física e emocional das mulheres. Eu acho que é possível fazermos melhor que isso.
aline rod.