Mulheres são parte da piada para a banda francesa ‘Attentat Fanfare!’

No dia 12 de janeiro passado, eu vi o show da banda francesa Atenttat Fanfare, no VL na cidade de Halle na Alemanha. O VL é uma hausprojekt, uma casa onde acontecem gigs, oficinas, encontros de grupos de esquerda e também é uma comunidade onde moram várias pessoas. Em seus princípios estão o anti racismo, o anti sexismo, a anti homofobia e a luta contra o anti semitismo.

Eu não fui propriamente para o show, mas estava na casa e acabei ficando. A banda subiu no palco. Os integrantes estavam todos fantasiados, exceto pela mulher que toca acordeon. O vocalista estava de pijamas e pantufas, e os outros integrantes vestiam outras fantasias ou acessórios ‘engraçados’. um deles estava ‘fantasiado’ de mulher. Não pude deixar de pensar que a piada era muito ruim.

Os homens sempre acham uma grande sacada se vestirem de mulher para serem engraçados e debochados. É misógino querer fazer graça com vestimentas associadas às mulheres. Enquanto para os homens pode ser uma brincadeira usar salto alto, maquiagem, etc, para a mulher é como o patriarcado nos força à feminilidade e estabelece como padrões de beleza que nos oprimem.

Apesar de eu ter críticas a esta e outras características da banda não foram estas as razões para eu escrever.

Faço aqui um relato do que se sucedeu durante o show.

No meio do show entre uma música e outra, o vocalista parou para anunciar a próxima música e começou dizendo: “eu estive no Rio no Brasil e lá as mulheres tem grandes ‘tetas’ e bundas incríveis.” E juntamente gesticulava desenhando seios e bundas grandes no ar com as mãos enquanto arregalava os olhos. Eu realmente não acreditei no ponto que chegara. Já estava bastante intragável aquela banda, mas este foi o dado mais concreto e sem nenhuma sombra de dúvida do que estava acontecendo ali. Esta frase só tem a seguinte leitura: misoginia e racismo. Falar das mulheres daquele jeito. Se referir daquela forma às mulheres brasileiras, de um país que muito provavelmente ele nunca tenha pisado, mas que se pisou também não melhora em nada.

Com esta atitude, ele mostrou sem nenhum constrangimento o seu privilégio como homem e como europeu. Ele achou muito engraçado utilizar do estereótipo que se têm – e que também se vende – da mulher brasileira. Ele não está nem aí para o que isso representa. O quanto as mulheres no Brasil são exploradas por exemplo pelo turismo sexual, que seus compatriotas, outros europeus e homens de outros países mais ricos fazem.

Ele simplesmente não sofre com a objetificação do seu corpo, ao contrário de nós mulheres que temos nossos corpos controlados pelo patriarcado e suas leis, onde nossos corpos são objetificados e vendidos em rótulos de cerveja, objetificados e violados inclusive por homens que confiamos. Onde os padrões de beleza nos oprimem e levam muitas mulheres a uma busca incansável e infrutífera pelo corpo perfeito do qual o capitalismo (além do patriarcado) se alimenta. Padrões estes que levam às mulheres, incluindo meninas muito novas, a depressão, anorexia, bulimia e outros transtornos que por si só já são muito sérios, mas que ainda podem levar à morte. Ele se coloca do degrau da misoginia, do privilégio de macho eurocentrado e racista. Ele se apresenta desta forma mesmo num local de reputação libertária e política. Porque os homens se sentem no direito de serem machistas e se beneficiam disso.

Eu reagi gritando contra o vocalista em meio ao som alto as seguintes frases: “you have no right to say what Brazilian women are! you sexist! you racist!”

Ele respondeu dizendo: “maybe I’m too drunk”.

O público seguiu dançando e eles continuaram tocando tranquilamente. E eu me retirei da sala.

Eu não quero com isso culpabilizar as pessoas que ali se encontravam pela falta de reação. Estou me atendo aos fatos, porque estes dizem bastante sobre como aconteceu e como eu me senti. E entendo que principalmente mulheres podem não se sentirem seguras para reagir. Acredito também que algumas pessoas “não viram”, não perceberam. Porém também não deixo de notar que parte deste “não ver” é por conta de que a luta contra a misoginia e o machismo não são consideradas causas legitimas. A luta das mulheres é luta de segunda ordem, para não dizer de terceira ou quinta muitas vezes na escala de hierarquia de lutas. Esta falta de reação me surpreendeu bastante neste contexto específico, diz muito sobre como patriarcado funciona e que é também dominante na cena de esquerda.

Eu posso dizer que eu notei. Eu fui atingida, nós todas as mulheres fomos atingidas pela atitude do vocalista,e por isso faço esta denúncia.

Gostaria de dizer que não sou patriota, não estava defendendo o “meu país”. Isso foi apenas coincidência, teria reagido contra ele da mesma forma se ele estivesse falando de qualquer mulher de qualquer outro lugar do planeta. O que ele fez é culpabilizar as mulheres por serem exploradas. Porque ele não falou dos homens que as exploram, das indústrias que as exploram, do sistema patriarcal. Ele estava objetificando e também debochando das mulheres que ele vê serem retratadas na mídia como enfeites de carnaval.

Porém a ofensa foi a todas as mulheres que ali estavam, quer as pessoas percebam isso ou não. E isso é misoginia.

Dizer que é “só uma piada” não é um bom argumento de defesa. Deu para perceber isso. Não melhora em absolutamente nada, apenas confirma o grau de misoginia e desrespeito pelas mulheres ao tratá-las como objeto também de chacota.

 

 

 

Women are part of the joke for the French band Attentat Fanfare

On the last January 12th I saw the show of this French band Attentat Fanfare, at VL in the city of Halle,Germany. VL is a hausprojekt, as they call here, a community where some people live, a place for gigs, workshops, left wing groups meetings and other things.

I was in the house and it happened that this band would play. The band got on stage. Except by the woman playing accordion they were all dressed in “funny” costumes. The singer was in pajamas and slippers and one of them was dressed “as a woman”.

I couldn’t help but think that it was a bad joke. Men always found a bright idea to dress up “as women” to make fun. It’s misogynistic to wear clothes associated to women in order to mock. While it can be a joke for men to wear high heels, make up, skirts, etc, for women these are things patriarchy forces us into femininity and establishes those as beauty standards that oppress us.

But. Although I’m critical of this and some other characterstics of this band, those weren’t the reasons for me writing this.

I’m reporting what took place during the concert.

In some part o the show, between songs, the singer started to announce the next song, he begun saying: “I was in Brazil and there women have big tits and great asses” (his words). At the same time his hands were drawing shapes of breasts and asses on the air while his eyes widned. I could not believe that he came at this far. For me the band was already hard to swallow, but that was a more tangible fact which left no room for doubts about what was going on. That sentence has only one interpretation: misogyny and racism. Talking about women on that way. To refer to Brazilian women on that way, from a country he probably never stepped in, but in case he did, it doesn’t count on his favor.

He showed his male and european privilege without any embarrassment. He found it very funny to reinforce the stereotype of Brazilian women. He simply doesn’t care of what this stands for. Of how women in Brazil are exploited by the sex tourism for example, which is a practice widely used for his compatriots, other european men, as well other men for any richer country.

He simply doesn’t have a clue what means to be objectified, different from us women, having our bodies been controlled by patriarchy and its laws, where our bodies are objectified and sold on beer labels, objectfied and violated for men including the ones we trust. Where the beauty standards oppress us and lead women on this restless and unsuccessful search for a perfect body/looking, which feeds both capitalism and patriarchy. Standards that are the cause for many women, also very young girls, for depression, eating disorders and other disturbances that are serius enough, but that can also lead to death. He placed himself from the step of misogyny, at the racist eurocentric male privilege place. He presents himself in this way, even in a place with political reputation. Because men feel entitled to be sexist and they benefit from it.

I reacted yelling at him in the middle of the noize the following sentences: “you have no right to say what brazilian women are! you sexist! you racist!

His answer was: “Maybe I’m too drunk”.

The audience kept dancing and they continued playing peacifully. And I left the room. I don’t want to blame the people there for their lack of reaction. I’m sticking into the facts for only one reason, because they (the facts) say a lot about what happened and how I did feel about it. I understand that sepecially women might not feel comfortable to react in situations like this. I also believe that some people didn’t see or realized it. However I also cannot help but noticing that part of “not seeing” it’s because the struggle against misogyny and sexism aren’t considered legitimate struggles. Women’s struggle is secondary, for not saying of third or fifth level in the hierachical scale of the struggles. This lack of reaction surprised me on that particular context and says a lot about how patriarchy works and also prevails in the left scene.

I can say that I have noticed, that it hit me, that his atittude hit all women, and that’s why I’ve decided to dennounce it.

I would like to inform I’m no patriot, I wasn’t defending “my country”. That’s just a coincidence, I would have reacted the same way if he would have talked about any women from any other place of the planet. What he did was to blame women for being exploited. He didn’t talked about the men who exploit them, about the industries that exploit them, neither about the patriarchal system. He objectified and also mock women who he sees been depicted in the media as carnaval accessories.

However, the offense was to all women in the room, even if people don’t realize it. And this is misogyny.

It’s not a good defense to say that it was just a joke. I realized that. And that doesn’t help it in any way, on the contrary, only confirms the level of misogyny and disrespect for women, because as doing so, you are treating women as object also for mockery.

Aline Rodrigues

Uma Ladainha Pela Sobrevivência – Audre Lorde

 “…Para aquelas de nós
que foram marcadas pelo medo
como uma linha tênue no meio de nossas testas
aprendendo a ter medo com o leite de nossas mães
pois por essa arma
essa ilusão de alguma segurança vindoura
os marchantes esperavam nos calar
Pra todas nós
este instante e esta glória
Não esperavam que sobrevivêssemos

E quando o sol nasce nós temos medo
ele pode não durar
quando o sol se põe nós temos medo
ele pode não nascer pela manhã
quando estamos de barriga cheia nós temos medo
de indigestão
quando nossos estômagos estão vazios nós temos medo
nós podemos nunca mais comer novamente
quando somos amadas nós temos medo
o amor vai acabar
quando estamos sozinhas nós temos medo
o amor nunca vai voltar
e quando falamos nós temos medo
nossas palavras não serão ouvidas
nem bem-vindas
mas quando estamos em silêncio
nós ainda temos medo

Então é melhor falar
tendo em mente que
não esperavam que sobrevivêssemos.”

Audre Lorde

 

Fala feita no Ato pela descriminalização do aborto – 28 de setembro

mulheres a nossa luta é diária! nós bem sabemos que a nossa luta é todo o dia! nós sabemos o quanto nos é caro lutarmos pela nossa autonomia, para que tenhamos direito de fazermos nossas próprias escolhas. 
 
hoje estamos aqui porque a nós mulheres é negada a decisão sobre o nosso próprio corpo. 
 
estamos lutando para que nossos corpos não sejam mais controlados por leis que pouco nos contemplam, por leis que foram feitas por homens é bom lembrar. pois se os homens ficassem grávidos o aborto seria legal.e por causa destas leis mulheres estão pagando com suas próprias vidas!
 
o aborto é uma realidade. de nada adianta fechar os olhos para não ver. O fato do aborto ser criminalizado não diminui sua prática apenas faz com que as mulheres abortem clandestinamente e fiquem a mercê de métodos perigosos para sua saúde, traumatizantes em todos os aspectos, e que levam mulheres à morte todos os dias. no Brasil anualmente cerca de 1 milhão e meio de mulheres abortam e correm risco de vida, ou sofrem graves sequelas decorrentes de abortos ilegais muitas vezes auto infligido. 
 
o aborto é uma questão de saúde pública. 
 
todas as mulheres que recorrem ao aborto estão em situação de risco, seja pelas práticas perigosas, seja por estarem sujeitas a serem condenadas a prisão.mesmo correndo o risco de serem presas, mesmo sabendo dos riscos à saúde,e do risco de vida, mesmo carregando a culpa moral ou religiosa, ou seja  mesmo diante desta realidade injusta e extremamente perigosa as mulheres recorrem ao aborto.
 
a criminalização do aborto é um descaso a saúde a integridade e a dignidade da mulher.e é por isso que hoje estamos aqui. 
 
hoje é um dia importante na nossa luta.
 
O 28 de setembro é marcado pelo Dia Latino-Americano e Caribenho de Luta pela Descriminalização do Aborto, e já completa pouco mais duas décadas de história. e seguiremos lutando até que consigamos fazer valer nossos direitos.
 
Para que as mulheres tenham direito ao aborto seguro e gratuito e o menos traumático possível tanto física quanto psicologicamente. porque nós merecemos!
 
mulheres! sigamos resistindo e lutando pelos nossos direitos!
muito obrigada
 28 de setembro de 2014
fala feita no ato pela descriminalização do aborto

28 de Setembro Dia Latino Americano e Caribenho de Luta Pela Descriminalização do Aborto – Relato

28 de Setembro de 2014.

8:00h.Telefono para a companheira: – Passo aí pra pegar o material?
– Passa
8:45h. Mensagem pra outra companheira: – Onde estão?
– Buscando os equipamentos, já vamos para a Redenção.
– Ok! Nos vemos lá.

As 9:05 começamos a descarregar e montar as estruturas, colocar as faixas, barbante, tesoura, pedra, martelo.

O gerador!
Precisa de quatro!
Não só duas dá!
Não, três!
Homem: – deixa que eu pego
– Não obrigada.
Ligamos o gerador, testamos o microfone. Tudo funcionando.
Canetas, pranchetas. Começamos a recolher assinaturas de apoio a causa. Começam a faltar folhas do abaixo assinado. – Vamos imprimir! Companheiras imprimem em suas casas. Trazem.

O sol já tá bem forte. Ainda bem pois a previsão era de chuva o dia inteiro.

12h preciso de um café.
12:30h nos revezamos para fazer lanche.
Calor.

Pessoas vem para conversar, apoiam, assinam. Pessoas discordam também.
Companheira no megafone. Pessoas curiosas param e prestam atenção.
Mais assinaturas.
Sede. Esqueci de tomar água.

Começam os gritos de luta! Pessoas curiosas param e prestam atenção. Mulheres se juntam e cantam junto. Mulheres sorriem. Mulheres conversam. Mulheres opinam. Mulheres vem e vão. E apoiam e nos sentimos bem. E nos sentimos vivas.

14h aula pública. Atrasou um pouco.

Desmonta tudo. Tira faixas, guarda as estruturas, carrega para o carro que vem vindo!
Ai por mim as estruturas ficariam aqui no parque para sempre….
Pranchetas e canetas ficam!
Mais assinaturas.

Mais ou menos as 15h saída para a marcha. No carro elétrico…
Coloca as faixas!
Mais gritos de luta!
Mulheres falam! Mulheres caminham, mulheres cantam.
Mulheres sorriem. E se entusiasmam.
Meu coração também.

Companheira quer descer! Companheira quer subir! O carro em movimento.
– Não pode
– Ok não faremos de novo.
Tudo indo bem. Ao mesmo tempo uma confusão boa! Nada muito certinho nem monótono.
Alguém me diz que o caminhão (trio elétrico) pode virar! Ai como assim?Não é nada só se lotar. Mas tem que cuidar. Tudo balançando mesmo…

Meu primeiro carnaval.

Seguimos mais um pouco.
Rimos mais um pouco. Ouvimos mais um pouco. Gritamos mais um pouco.
Chegamos.
Tira as faixas.
Desce.
Homem estende a mão -Não, obrigada.

Arrumamos nossas coisas. Juntamos tudo, esperamos umas as outras.Vamos embora.
Ainda não, alguém tem coisas para nos dizer…
Estamos cansadas. Conversamos.
Certo agora vamos embora.
Sentamos num bar.

A chuva cai.

E sorrimos.

 

 

 

Reforçando o pensamento

as vezes que fico exausta, quando a luta mostra o seu lado mais pesado é quando eu paro um momento para reforçar o pensamento. como eu sei que é uma questão de sobrevivência, minha, de todas as mulheres incluindo das que virão, eu não penso em voltar atrás. porque eu não tenho outra escolha. eu tomo muito cuidado para não desmotivar as mulheres porque eu gostaria que fizessem o mesmo comigo.
porque eu sei o quanto é importante para a nossa sanidade mental.
pensem que cada gesto, cada palavra tem uma reverberação. pensem em sermos como aquelas guerreiras impecáveis, e que o caminho escolhido invariavelmente leva outras com a gente. cada uma de nós tem seu limite.por isso mesmo.

 

Escrachando o Feminismo Radical – uma resposta às acusações ao feminismo radical de poa

Abaixo segue a resposta à “Moção de Repúdio ao Movimento Feminista Radical de POA”. A resposta fala por si, contextualiza, em fim, não há necessidade de introdução basta lê-la. Mas sinto a necessidade de colocar o seguinte:

Uma moção de repúdio a feministas radicais daqui ou de qualquer lugar é algo questionável. É questionável do ponto de vista feminista fazer uma moção de repúdio contra mulheres que se organizam para lutarem por libertação. Uma moção de repúdio? Um repudio? Uma coisa é discordar teoricamente, uma coisa é escolher com quem vai se aliar, com quem vai lutar e de qual forma. Mas outra coisa bem diferente é REPUDIAR feministas e ainda tornar isso público e colocar a segurança física e emocional de um determinado grupo de mulheres em risco. Não é possível fazer acusações por fazer, sem um mínimo de consideração, sem informação pelo que se está criticando, em fim. Nós mulheres já somos alvos de ataques misóginos de todos os níveis, nossa luta e sobrevivência são parte do nosso diário.

Também acho importante ressaltar o apoio que o “repúdio” recebeu, quando prontamente 100 pessoas “curtiram”. 100 pessoas se sentiram confortáveis o suficiente para tornar público que concordam com ser possível repudiar um grupo de mulheres que compartilham da teoria feminista radical.

Eu queria problematizar isso. De onde vem este conforto, esta confiança para se dar este apoio? Sim, é seguro criticar feministas radicais, pois são odiadas, são taxadas de transfóbicas, de excludentes, de anti-homens. Nada mais seguro e confortável persegui-las sem tentar compreendê-las. E diria mais, esta não é uma questão de não “tentar” compreendê-las somente, mas percebo que é uma negação proposital, porque compreender o feminismo radical causaria ter que rever suas posições, seus privilégios, ceder espaço para mulheres, todas estas coisas da quais os homens se beneficiam no patriarcado. Então não finjam que estão do lado das mulheres, do nosso lado, porque vocês não estão, e ativamente estão contribuindo com a exploração e a opressão que combatemos para a nossa libertação, e para que sejamos silenciadas.

Também gostaria de frisar que o escracho não foi uma ação feita por feministas radicais, então a “Moção de repúdio às feministas radicais de Poa” é difamatória. Porém como está explicada na carta abaixo não farei desta a defesa das feministas radicais, porque respeitamos a ação escolhida(o escracho) por estas mulheres e cabe apenas a elas falarem por elas se assim desejarem.

Isso tudo é assustador: existir uma moção de repudio a mulheres feministas radicais, e 100 pessoas tornarem público seu acordo a isso. É assustador utilizar de um escracho denunciando o machismo para atacar um grupo de mulheres. É assustador também que mesmo com a descoberta de que não foi este grupo de mulheres (feministas radicais) que fizeram este escracho, tenha se sucedido uma “retratação” que apenas reforçou as críticas levianas ao feminismo radical, e não consiste em retratação de forma alguma, mas apenas a continuidade da postura de irresponsabilidade política adotada. E mesmo sabendo disso as pessoas continuaram “curtindo” ou mantiveram lá suas “curtidas”.

Ao contrário do que dizem os difamadores, feministas radicais são mulheres de todos os tipos e lugares, de classes sociais , raças e etnias diferentes. O que nos aproxima vai além da teoria, porque nossa teoria e nossa prática andam juntas. É comum encontramos no feminismo radical o único espaço onde sentimos conforto, compreensão e acolhimento. E ao contrário do que dizem, o feminismo radical não é a teoria feminista mais difundida nas universidades, se fosse não seria uma vergonha mas uma conquista. Sejam honestos pelo menos com isso.

enila dor.
ESCRACHANDO O FEMINISMO RADICAL

Sobre as acusações ao feminismo radical POA referentes ao escracho no Bar Zumbi

Diante de diversas acusações, nos sentimos compelidas a dar respostas a uma série de falácias motivadas e endossadas por toda uma histórica perseguição a mulheres feministas. Perseguição esta que atualmente assume nova roupagem, mas continua servindo da mesma maneira ao patriarcado, desacreditando e desarticulando a nossa luta. A perseguição a feministas radicais chegou a tal ponto que fomos responsabilizadas por decisões que não tomamos, como, por exemplo, pelo recente escracho organizado por mulheres autônomas de diversas correntes feministas contra o bar Zumbi e o evento que seria lá sediado.

No último período, Porto Alegre (bem como outras cidades do país e do mundo) tem sido palco de festas que se dizem alternativas e libertárias e que, no entanto, tem demonstrado conteúdo misógino, machista, lesbofóbico e racista, tornando-se espaços de silenciamento, assédio e abuso de mulheres. Neste contexto, várias mulheres têm se organizado para se contrapor a essas iniciativas. Embora o movimento radical não tenha organizado o referido escracho, salientamos que sempre estivemos e sempre estaremos ao lado das mulheres que combatem o machismo em suas diferentes manifestações. Não falaremos aqui sobre as críticas feitas ao método utilizado por essas mulheres, pois acreditamos que elas mesmas podem se pronunciar sobre isso.

Quanto às críticas direcionadas ao movimento, percebemos que vem ocorrendo interpretações errôneas sobre o que é o feminismo radical. Somos feministas radicais porque buscamos combater a opressão patriarcal em sua raiz. No entanto temos sofrido a acusação de transfobia como uma associação direta à teoria radical. Entendemos que a associação de feminismo radical à transfobia é uma redução desonesta de todas as demandas desse movimento a uma mentira que se utiliza desse “carimbo” como ferramenta de perseguição de militantes e uma maneira de invisibilizar as pautas que dizem respeito a mulheres e suas vivências. Consideramos a acusação de transfobia leviana e irresponsável, na medida em que culpabiliza mulheres militantes por uma violência real causada por um inimigo comum, que tem os mesmos ideais machistas que combatemos.

Também consideramos que a acusação de academicismo que feministas vêm sofrendo é bastante problemática, tendo em vista toda a história de exclusão das mulheres no acesso ao conhecimento formal e da configuração de um espaço acadêmico extremamente machista e dominado por homens. Reivindicamos o conhecimento formal produzido por escritoras, cientistas e estudantes, num esforço de valorizar o saber produzido pelas mulheres, que deve ser passado adiante dentro dos espaços feministas para enriquecer nossa luta com a perspectiva feminina e valorizar a herança deixada pelas mulheres que vieram antes de nós. No entanto, não entendemos conhecimento formal como algo que desvalorize ou se contraponha às vivências feministas, mas que são complementares. Nosso feminismo é construído cotidianamente através da nossa prática, a partir das nossas ações na luta global das mulheres pelas mulheres.

Além das demais acusações acima, houve a de racismo. Enfatizamos nosso posicionamento contra o racismo, o qual consideramos uma violência muito grave, que combatemos em nossa atuação e cuja acusação levamos extremamente a sério. Nesse sentido, gostaríamos que fosse apontado onde está o racismo em nossas problematizações. Lamentamos, ainda, que seja dito que a motivação das mulheres que realizaram o referido escracho tenha sido racista, pois é um contrassenso, uma vez que entendemos que o objetivo do escracho e das manifestações das redes sociais foi justamente denunciar o conteúdo racista (além de misógino, machista e lesbofóbico) do evento que teria lugar no bar Zumbi e com a qual os organizadores, os donos do bar e as bandas participantes foram coniventes.

Não podemos ignorar que foi de extrema irresponsabilidade política e pessoal as acusações feitas tanto ao grupo que realizou o escracho quanto as mulheres organizadas no feminismo radical, pois expôs e colocou em risco a integridade física e moral de integrantes de ambos os grupos.

Infelizmente é inviável abordar todas as pautas necessárias a este texto e a este contexto, no entanto, gostaríamos de convidar todas as mulheres a construir conosco um movimento feminista de maneira responsável, coerente e que não exponha mulheres, mas sim lute por elas.”

Legalização da prostituição e Projeto de Lei de Jean Wyllys: Legalizando a mercantilização dos corpos de mulheres, protegendo os que as exploram

O projeto de lei do deputado Jean Wyllys tem como objetivo legalizar a prostituição e as casas de prostituição e garantir proteção aos cafetões e aos usuários. Segundo Jean Wyllys as mulheres prostituídas estarão protegidas da violência, que segundo ele acontece na rua, e estarão garantidas de exercerem com “dignidade” o que ele e o segmento neoliberal chamam de “trabalho sexual”: termo usado para apagar que a exploração (dos corpos de mulheres) é inerente a prostituição.

Jean Wyllys explica que o projeto de lei foi nomeado como PL Gabriela Leite, por ela ser uma mulher que escolheu entrar para a prostituição. Gabriela Leite é branca, pertencente a classe média e ex aluna de filosofia da USP, e virou o exemplo, muito conveniente, para quem defende que a prostituição pode ser uma escolha. Ao constatar que Gabriela Leite é uma mulher que escolheu se prostituir, e passar a tê-la como exemplo, está-se automaticamente negligenciando todas as outras mulheres que não escolheram serem prostituídas, que não estão nas mesmas condições nem têm a mesma história que ela. Mas ah, quem se importa com estas mulheres!

Então a ala defensora da prostituição se preocupa com as mulheres que escolhem, porém não a ouvimos dar a mesma atenção para as mulheres que querem sair da prostituição e não conseguem, que de fato, são a grande maioria da classe. Não vemos quem defende a descriminalização dos cafetões e dos usuários, falar em proteção e garantias as mulheres que querem sair da prostituição. Por quê não existem programas nem projetos de lei para tanto? E por quê as mulheres não conseguem sair da prostituição? Esta é uma questão muito importante para entendermos como funciona a entrada das mulheres e meninas na prostituição, porque o que acontece é que classe, cor da pele e etnia, são fatores determinantes para que mulheres e meninas entrem para a prostituição e com que não consigam empregos melhores. Outro fator relevante pra a entrada na prostituição e que mostra o tratamento desproporcionalmente desigual entre homens e mulheres é o abuso e a violência que as mulheres sofrem mesmo no âmbito familiar, muitas vezes desde criança. O abuso e a violência são altamente determinantes para que meninas e mulheres se prostituam. O abuso e a violência que as meninas e mulheres são submetidas fazem parte do ciclo que leva a mais abuso e violência, mas é visto como “escolha”, é visto como algo da “natureza humana”, prefere-se dizer que a prostituição é a profissão mais antiga do mundo embora essa não seja verdade, pois as mulheres foram antes caçadoras, coletoras, pintoras… Falar em escolha é bastante fantasioso quando a prostituição é a única “escolha” para milhões de mulheres.

Mas é disto que o pensamento neoliberal trata, de que o indivíduo escolhe e isso implica que se ele está numa situação ruim, é por sua “culpa”, pois poderia ter escolhido diferente. É esta a premissa do mercado competitivo capitalista. E vemos muitas pessoas culpando as pessoas desfavorecidas, as pessoas pobres, as que não conseguiram um emprego melhor, as que não tiveram oportunidade de estudo, como se elas apenas não tivessem capacidade de estudar e se dar bem na vida.

Não se escolhe ser “prostituta” e não se escolhe estar desempregada(o) passando dificuldade.

Já foi muito bem pontuado que se a prostituição fosse tão empoderadora, os homens estariam fazendo fila para se prostituírem.

Mas os homens não precisam recorrer a prostituição pois lhes é garantido outros empregos e oportunidades, são as mulheres uma subclasse que não precisa ter a mesma chance de proteção e cuidado dada aos homens. A verdade é que os corpos dos homens são deles, eles são os proprietários de seus corpos. Já as mulheres devem pertencer aos homens (maridos, amantes, clientes, pais, irmãos…), ao estado, a igreja e ao poder legislativo (também majoritariamente masculinos). São os nossos corpos que são estuprados, são os nossos corpos que são controlados e objetificados, são os nossos corpos que são mercantilizados e são os nossos corpos que engravidam – porém não temos poder de decisão pelo mesmo.A prostituição não diferentemente também é fruto desta dominação masculina.

Proponho em refletirmos de forma inversa para entendermos esta questão da escolha na prostituição. Se a prostituição é uma escolha seria o mesmo que dizer que está na mesa escolhermos entre sermos advogada, professora, faxineira, secretária, médica, enfermeira, doméstica, prostituta, por exemplo. Estão realmente na mesa estas opções igualmente para todas? Não vemos nitidamente as diferenças entre as oportunidades? Sabemos de onde vêm as diferenças. Logo as mulheres que não tiveram que se prostituir não “escolheram” não se prostituir. Não ponham nas nossas bocas que temos moral, que somos “boas moças”. Parem com este discurso moralista e conservador, que sempre nos reduz a santas ou putas, puritanas ou liberadas, para defender a legalização da prostituição.

A diferença é que a prostituição é a única “oferta” para milhões de mulheres mas não é para os homens.

Outro argumento utilizado pelos defensores da prostituição é que ela é uma prestação de serviços como outra qualquer, um trabalho como qualquer outro. A prostituição não é uma prestação de serviço como outra qualquer só porque existe(nem sempre) troca por dinheiro, ela não é como qualquer outro trabalho porque ela é inerentemente desigual, já que existe um explorador bem específico- o homem, e uma explorada bem específica- a mulher. Ela implica que a mulher sirva ao homem, ela valoriza as “necessidades” do homem, mesmo que esta “necessidade” de fato foi coisa inventada. É disso que a indústria do sexo consiste, em criar necessidades para os homens, direcionadas ao consumo deles.Todo serviço prestado é por troca de dinheiro, mas os serviços são também divididos entre a classe das mulheres e a classe dos homens e garantem melhores condições para esta última. Existem muitos trabalhos onde as pessoas são exploradas, porém constatar isso não pode servir de argumento de que as prostituídas também podem ser exploradas.

O que é revoltante no discurso de Jean Wyllys, e o que demonstra a verdadeira face deste projeto de lei, é a preocupação em “proteger” os homens que compram as mulheres, e os que lucram explorando estas mulheres: os cafetões. Jean Wyllys tenta convencer os congressistas dizendo que pelo fato de a maioria deles utilizarem destes “serviços” que o projeto de lei lhes beneficiaria, ou seja, lhes daria legitimidade para continuarem explorando as mulheres e mercantilizando seus corpos sem que corram o risco de serem punidos! É realmente muito boa essa. Segundo suas próprias palavras “não será difícil aprovar o projeto já que a maioria dos homens congressistas usam as prostitutas” É exatamente isso Jean Wyllys, os homens USAM as mulheres. E esta “maioria dos homens congressistas” seria o mesmo que dizer a maioria do congresso, certo? Não é coincidência que as mulheres sejam maioria incomparável das pessoas prostituídas e os homens a maioria das pessoas que estão no congresso.

É bom lembrar que a punição aos usuários e cafetões, apesar de estar prevista na lei, já não acontece com devida frequência. Quem mais sofre punição são as mulheres prostituídas, como aconteceu em Niterói no dia 23 de maio último, onde as mulheres que se encontravam no prédio invadido pela polícia foram abusadas, estupradas, tiveram dinheiro e outros pertences roubados, e muitas delas foram detidas. A descriminalização de usuários e cafetões, acaba de vez com a única garantia que as mulheres prostituídas têm, pois legitima a exploração destas mulheres, legaliza a exploração que não vai deixar de acontecer.

Pela descriminalização das mulheres prostituídas, mas não para quem as exploram.

Mas Jean Wyllys mostra preocupação também com o turista sexual que está chegando para a o grande evento maravilhoso que é a copa do mundo! E ele estava tentando aprovar este projeto de lei antes da Copa! Este evento que está desmantelando e desalojando famílias, removendo moradoras(es) de rua. Este evento que está impedindo milhares de pessoas que trabalham nas ruas de seguirem com seu ganha pão. Este grande evento que está criminalizando os movimentos sociais e legitimando ainda mais a violência policial e também punindo, prendendo e indiciando manifestantes e quem está se opondo a Copa. E eu acho isso relevante de dizer porque tentar aprovar a lei para a copa mostra uma perspectiva de descaso também com todas as problemáticas que a copa acarreta na vida das pessoas de forma violenta e arbitrária.

Jean Wyllys ainda afirma no alto da sua modéstia que “As únicas pessoas que se opõem a mim são as moralistas”. Aqui Jean Wyllys desconhece ou simplesmente descarta que uma das pautas do feminismo é a liberdade para todas as mulheres e que isso inclui as mulheres prostituídas, que o feminismo também é luta contra toda e qualquer forma de humilhação e exploração das mulheres.

Talvez não seja por desconhecimento que Jean Wyllys descarte o que estamos dizendo, talvez seja pelo fato de que como homem, e por isso em posição de privilégio, lhe falte compreensão sobre a importância da libertação das mulheres, e sobre a raiz da opressão que impede a libertação. Talvez Jean wyllys não ouve o que o feminismo diz que as mulheres, e isso inclui as prostituídas (caso alguém tenha se esquecido) não precisam de homens para representá-las. Um homem nunca representará mulher nenhuma.

Da mesma forma, eu sei que não posso representar as mulheres prostituídas. Mas como mulher e feminista eu tenho minhas opiniões no que diz respeito a opressão de mulheres, e isso inclui as mulheres prostituídas, se não meu feminismo seria um “feminismo” só para as mulheres das quais “merecem minha atenção”. Eu discordo de que tanto Jean Wyllys, como Gabriela Leite possam representar toda a classe prostituída. Quem é Jean Wyllys para representá-las? É realmente Gabriela Leite e mesmo seu grupo singular de mulheres uma representatividade a toda classe prostituída? Ao mesmo tempo que se fala em ouvir das mulheres prostituídas, se dá voz a uma pessoa bem específica pertencente a uma absoluta minoria de uma realidade bem particular como a de Gabriela Leite, e de um grupo seleto de mulheres que estão dizendo que escolheram entrarem para a prostituição.

Seguindo no discurso de Jean Wyllys ele diz que “Continuar deixando essas casas na ilegalidade é jogar essas profissionais nas ruas e aumentar a desproteção e o risco de que sofram violência.” e também que “A casa de prostituição é permitida desde que nela não se exerce qualquer tipo de exploração sexual.”

Esta é uma total falta de conhecimento de como funciona a prostituição, ou talvez apenas um argumento para convencer mas que não é factual. Na realidade as mulheres prostituídas também sofrem violências entre quatro paredes, são estupradas, abusadas, apanham, sofrem tortura e também são assassinadas em quartos, e isso inclui pelos cafetões. É pura fantasia achar que a rua é o único local de perigo, seria o mesmo que dizer que estupro só acontece na rua, ou à noite, ou por desconhecidos, quando sabemos que o estupro acontece largamente em espaços supostamente seguros, por pessoas próximas. Muitas prostituídas se sentem mais seguras longe das casas de prostituição onde elas não exercem nenhum poder sobre si mesmas, onde ao contrário estão totalmente dependentes e a mercê dos donos destes estabelecimentos que têm como subsistência a exploração destas mulheres. Acreditar que as mulheres estarão protegidas fora das ruas é um equívoco. Não haverá lei que protegerá a mulher num quarto de algum estabelecimento quando ela estiver sozinha com seus clientes ou cafetões. Não haverá respeito ás leis, não haverá limites aceitáveis. Muitas mulheres prostituídas relatam que uma vez que o cliente paga, elas não podem dizer “Não”. Quais homens respeitam os limites que elas tentam impor? E quando a necessidade fala mais alto, quais limites elas conseguem demarcar para si mesmas? É muito desumano o tratamento que as mulheres prostituídas recebem, é absolutamente muito desumano e só evidencia a posição das mulheres no patriarcado. É uma ilusão achar que as regras trabalhistas podem ser cumpridas na prostituição.

Não podemos abandonar nem esquecer nenhum grupo de mulheres, nenhuma mulher. Não podemos contribuir para manutenção do domínio dos homens sobre as mulheres, reduzindo as mulheres a seres submissos, servis, dependentes e sempre definidas em relação aos homens. Temos que parar de pormos em primeiro lugar as “necessidades” dos homens. É preciso uma mudança de paradigma. Temos que parar de comprar as crenças masculinistas impostas sobre nós de forma a nos destruir, a nos apagar, a nos subjugar, a nos manter ignorantes das nossas infinitas possibilidades e potenciais.

enilador.
13.06.2014

 

 

Estupro Realidade Brutal – Mulheres São Violentadas e Silenciadas

Estupro. Violência e terrorismo que é realidade das mulheres. Não, não consegui me expressar direito. Jamais conseguiremos expressar a brutalidade de um estupro. Jamais conseguiremos através de palavras fazer jus ao que as mulheres estão passando desde sempre.

Ontem cheguei em casa e vi três notícias, uma atrás da outra. As três notícias eram:

-Duas adolescentes foram encontradas mortas enforcadas, penduradas numa árvore em uma vila no norte da Índia, depois de terem sido estupradas por cinco homens na última quinta feira.

-Menina de quinze anos foi estuprada por trinta e oito homens no norte da Malásia.

-Adolescente estuprada por cinco jovens em Pinhal (RS). Os estupradores filmaram e repassaram o vídeo pela internet.

Mais uma vez, mais um dia, mais uma mulher.Todos os dias mulheres são estupradas. Em todas as partes do mundo.Todos os dias mulheres são assassinadas.

Estou falando de estupro, esta violência que as mulheres sofrem dos homens. Não quero falar em violência “de gênero” e omitir quem é o agressor e quem é a vítima. Estou falando de estupro, esta de uma das faces da misoginia, do sistema patriarcal. Estou falando de estupro, do que as mulheres têm que passar, que está no nosso imaginário, na nossa biografia. Esta ameaça a qual estamos “habituadas” desde muito pequenas e que lutamos para que não nos aconteça. Mas nos acontece. Que é seguida de morte ou não. Mas que sempre alguma coisa mata.

O estupro é a face do machismo que viola nossos corpos, onde o estuprador quer ter o poder, quer ter o controle, quer minar que continuemos vivendo como vivíamos até então. Quer matar se não a gente a nossa liberdade. Porque não podemos ser livres. Não podemos escolher, decidir onde vamos, como estamos, nos sentimos. Não podemos gesticular, nos mover como queremos, isso tem que ter um preço. Precisamos ser castigadas. Só uma mulher sabe como sua vida, seu diário é baseado, é modificado, é moldado por esta constante ameaça.

Conheci mulheres que negam isso. Que dizem que não sentem o machismo. Que hoje em dia “isso” acabou. Quando questionei amigas que disseram essas coisas lhes perguntando “por que então você está chamando seu amigo para lhe acompanhar até sua casa?”, “por que você não vai a pé se é tão perto?” elas perceberam na hora o que até então não tinham levado ao nível da consciência.

Mulheres procuram proteção, e muitas vezes de outros homens. Os homens nos massacram e nos “salvam”. Mas nós sabemos que não é viável depender de um homem. Mulheres carregam chaves nos meios dos dedos, olham para trás com qualquer barulho, entram em banheiros públicos acompanhadas umas das outras, ou com muito cuidado, ou não entram, verificam portas e janelas quando estão sozinhas em casa de forma compulsiva, mudam de roupa, não correm em parques à noite, ou mesmo durante o dia, fazem autodefesa, carregam spray de pimenta, faca, arma de fogo, em fim, estamos sempre em alerta. Uma destas ações ou várias delas combinadas ou todas e muitas outras, fazem parte da vida das mulheres. Eu não estou preocupada se isso é paranoia para você. Se isso é muito pouco relaxante, ou pouco zen, ou pouco qualquer teoria mística. Porque estas coisas talvez não sejam para as mulheres. Estas coisas são privilégios de homens. A nós resta a “paranoia”. A nós resta a auto defesa necessária, a força e a técnica necessárias para seguirmos confiantes. E quem alcança esta força e técnica ao ponto de se sentir intocável? E aonde está o acesso a isso? E com quem está o conhecimento? Não estou desmotivando a autodefesa, pelo contrário, acredito ser fundamental para nossa autonomia. Mas não é como nadar num rio e se deixar levar numa corrente segura e morna. É uma luta. É um aprendizado. E também é uma capacitação que nem todas tem as mesmas chances ou vontade para tanto.

E com toda esta realidade que se mostra da forma mais hostil possível, nós ainda temos que nos calar. Nós mulheres somos violentadas e silenciadas ao mesmo tempo, obviamente, uma coisa é intrínseca a outra.

Somos silenciadas quando não nos acreditam. Somos silenciadas quando dizem que estamos exagerando. Somos silenciadas quando somos chantageadas de que estragaremos as coisas, a família, a cena “libertária”, a harmonia no trabalho, na escola, a boa vizinhança. Somos silenciadas com ameaças de mais violência, de morte, de exclusão. Somos silenciadas quando nos dizem que mulheres também estupram, quando não é dito para darmos atenção a esses casos – que também são fruto da cultura machista – mas para tirar nossa razão e vaporizar nossos inimigos. Somos silenciadas quando dizem que homens também são estuprados, sendo que sabemos que quando isso acontece os agressores são na quase totalidade homens, e isso não ajuda em nada os homens, geralmente meninos, que são estuprados. Isso também não é para dar a atenção devida a este menino, este homem, é um argumento utilizado de forma suja, sem solidariedade com estes meninos, com estes homens. É para nos calarem que usam destes argumentos. Somos silenciadas quando acusam textos como este que escrevo de cissexista porque ousa falar de mulheres. Então todas as especificidades que nós mulheres passamos são desvalorizadas, desprezadas, jogadas no lixo porque estamos sempre esquecendo alguém. Eu estou falando de mulheres porque, feminismo? Estou falando da violência dos homens contra as mulheres porque esta é a lei misógina. E caso precise lembrar misoginia é o ódio contra as mulheres, é o profundo desprezo pelas mulheres. Obviamente qualquer pessoa que seja “reduzida” a esta categoria sofrerá consequências da misoginia com suas especificidades.

E misoginia é também silenciar as mulheres e desprezar a forma como queremos nos organizar. É dizer a nós como devemos fazer o feminismo e o que o feminismo tem que abraçar, do que ele “deve” tratar.

E somos silenciadas quando não podemos denunciar o estupro pelo risco de respondermos a um processo judicial, fundamentado em leis machistas que favorecem os homens que estupram.

Nós mulheres somos estupradas e silenciadas pelos homens, somos silenciadas por suas leis e suas crenças e por quem compra essas leis e essas crenças.

31.05.2014

 

A Marcha Das Vadias Não É Solidária

O texto que segue foi escrito há pouco mais de um ano atrás. Porém eu desisti de publicá-lo por vários motivos. Eu me senti cansada ao obter na grande maioria das vezes respostas que demonstraram nenhuma ou pouca compreensão dos argumentos que utilizei em textos ou em conversas (pelo menos no meu convívio). Eu fiquei estigmatizada, eu nem vou explicar, mas eu sei que isso aconteceu. Eu sei também que este é o preço de qualquer ideia menos popular, é o preço pago por feministas, ou qualquer mulher que rompe o silêncio. Tudo bem. Além disso eu conheço muitas mulheres e garotas que são adeptas da Marcha das Vadias, e eu sempre me preocupo com a opinião destas, se elas vão pensar que eu estou contra elas, se elas vão levar para o “lado pessoal”, e acho que no fim sim. E isso também é parte do processo, ou o preço que pago. Mas eu estou absolutamente disposta a lutar pelo feminismo da forma como eu vejo o feminismo: o que eu acredito ser a luta pela libertação de todas nós mulheres.

 Aconteceu uma edição da Marcha das Vadias domingo passado e eu acabei me envolvendo mais uma vez com esse assunto. Achei este texto nas minhas coisas e percebi que ainda está atual com o que eu penso.

Quero agradecer  a todas que me dão apoio, as que comentam aqui no blog, as que compartilham da crítica,as  que tem outras ideias que complementam, a quem compartilha os textos, em fim. 

 

A Marcha das Vadias está consolidada podemos dizer assim. Infelizmente a marcha abafa muitas questões feministas, ao mesmo tempo que utiliza de argumentos feministas para justificá-la. A meu ver a marcha não só é bastante inconsistente como ação feminista mas é contraditória como tal e um passo atrás. Eu acho ainda estranho que as pessoas que defendem a Marcha das Vadias falem em vários feminismos ao mesmo tempo que não aceitam outros feminismos e procuram categorizar qualquer crítica à Marcha como conservadora. A Marcha tem conseguido de forma eficaz uma homogeneização das feministas que nos prejudica bastante. Ser feminista passou a ser sinônimo de ser participante da Marcha ao ponto de ser um choque quando uma feminista não se engaja à Marcha das Vadias.

Por que será que todas as demandas feministas, todas as lutas que mulheres feministas engajadas propõe não são ouvidas nem levadas a sério e a Marcha das Vadias de um dia para o outro passa a ser a “voz das mulheres”? Por que tantos homens passaram a aderir a Marcha das Vadias, sem sequer compreendem outras ações que propomos? E por que ao contrário de um aprofundamento nestas questões ao constatarem isso, as pessoas da Marcha preferem dizer que isso é uma coisa positiva?

Por que a mídia tem tanto interesse na Marcha das Vadias? Acredito que o apelo que a Marcha tem é em função também da sociedade nos querer objetificadas. Desta forma as mulheres estão mais uma vez sendo usadas pelo patriarcado e pelo capitalismo, servindo as propostas neoliberais. A Marcha é um evento que cabe como uma luva na cultura da sexualização e da objetificação dos nossos corpos, mesmo que as pessoas acreditem que é uma forma de lutar pela liberdade de suas sexualidades. Eu acredito que a Marcha das Vadias se encaixa perfeitamente para que não aprofundemos o feminismo e na questão vital de que não está nos libertando, mas corroborando para dizer que sim, somos todas vadias! E isso atinge que ponto exatamente? De liberdade sexual? Eu acredito que não. Para mim abraça a lógica machista de que somos vadias, e somos o que os homens quiserem que sejamos. E agora além de sermos o que os homens querem que sejamos, dizemos sim! E sim, agora descobrimos que podemos ser objetificadas e hipersexualizadas, que isso é muito bom para a nossa liberdade sexual, basta dizermos que somos objeto do nosso próprio desejo! Sério? Para mim abraça a cultura de que somos desejáveis ao olhos de homens e que sigamos nos comportando como objetos de desejo masculino em termos historicamente criados para excitarem os homens, não importa o quanto justifiquemos com o discurso de que somos objeto de nosso próprio desejo. Quem está querendo enganar quem?

A marcha consiste de um ponto de vista extremamente individual, por isso também se enquadra no pensamento neoliberal, onde cada mulher está centrada em si mesma dizendo “eu faço o que eu quero”, “isso é bom pra mim”, “sou livre” ignorando que muitas mulheres não tem a mesma oportunidade de escolha. Muitas de nós mulheres que são ou foram tratadas como vadias não querem se apropriar deste termo, e muitíssimo pelo contrário, queremos nos livrar deste, pois queremos poder sermos nós mesmas sem que nos ponham selos! ‘Eu tenho visto e também sentido na pele, que o termo vadia sempre foi usado como ferramenta misógina. E por mais que a Marcha das Vadias quer se apropriar disso, nós mulheres não vamos deixar de sermos tratadas como vadias, putas, vacas, etc quando alguém assim desejar. Digamos que seja possível ressignificar o termo Vadia, vamos supor que isso seja possível, podemos estar certas de que outro termo será criado para qualquer comportamento ou realidade das mulheres, e as mulheres prostituídas terão que ter uma nova denominação, porque estas precisam ser tratadas como vadias na vista da sociedade. Nós não vamos estar eliminando o problema, apenas mudando de nome, mas continuaremos sendo menosprezadas – umas mais que outras, isso é importante ressaltar: quem são as mais menosprezadas? Ou ainda, quem são as privilegiadas?

Não esqueçam que o termo vadia é um termo criado pelo heteropatriarcado,  porque se refere a mulher em relação ao homem. A mulher sozinha é santa, o outro lado da mesma moeda, de um também estereótipo que visa controlar, pois a mulher também não pode estar sozinha, ela precisa de um homem, mas não mais de um. Já as lésbicas são aberrações e ameaçam o papel da mulher de reprodução. Conceitos heterossexistas e conservadores para que compremos conforme nossa “opção”, conforme no que melhor nos enquadramos.

Mas não, não vale a pena nos rotularmos!

O que é ser uma vadia? É um tipo de comportamento? É usar um tipo de roupa? A mulher que “dá pra todo mundo”?

Eu não acredito em nenhuma destas premissas e acho incrível como esta apropriação apaga de vista as mulheres prostituídas porque fala em comportamento, mas jamais fala sobre a exploração e a violência que as prostituídas enfrentam.Com certeza a marcha não fala pelas mulheres prostituídas, antes pelo contrário ela ignora estas mulheres que não podem escolher um dia do ano, como fazem a maioria das mulheres na marcha ao se apropriarem do termo e se vestirem como vadias. Mulheres que são tratadas com desprezo, abuso e violência, simplesmente porque elas são as “verdadeiras vadias” para a sociedade todos os dias.

Pois nós todas as mulheres, prostituídas ou não, não somos vadias, vagabundas ou vacas. Se uma mulher ou garota que regularmente vai pra escola ou para o trabalho mas um dia por ano resolve ir a marcha utilizando o termo vadia, ela está agindo de maneira colonizadora, porque ela não sofre de forma alguma as consequências de ser uma “vadia de verdade”, ela não tem homens fazendo fila para estuprá-la com respaldo da sociedade, que acredita que suas filhas estão salvas enquanto estas mulheres que “escolheram” serem “prostitutas” existirem para que os homens descarreguem todo seu ódio e violência que sentem pelas mulheres (como disse Rebecca Mott.). Esta mulher ou garota que vai a marcha e diz que é puta, só o diz por estar numa absoluta posição de privilégio que inclui escolher o dia que vai ser ou se vestir “como puta”. O problema não é estar numa posição de privilégio, como alguém me perguntou: “qual o problema destas garotas na maioria brancas de classe média fazerem suas reivindicações?” Não seria problema mesmo, se isso não contribuísse ativamente para apagar os problemas que outras indivíduas estão passando. Feminismo para mim está absolutamente conectado com solidariedade entre mulheres, então torno a repetir que se milhões de mulheres querem se livrar do peso de serem tratadas como vadias e que o termo vadia lhes machuca e elas estão dizendo isso, porque ignorá-las? Será que pelo menos isso não merece a atenção das pessoas que marcham?

Acredito que muitas garotas principalmente as novas, realmente acreditam que o que a Marcha propõe favorece a liberdade de nós mulheres, não duvido das intenções de muitas pessoas envolvidas na Marcha. A questão que coloco não é para ficarmos em batalha, de forma alguma. As críticas que coloco são para propormos uma Marcha que agregue mais mulheres, que todas as mulheres se sintam confortáveis para caminharem juntas.Se a reivindicação é contra a violência sexual, marchemos contra a violência sexual. Se a reivindicação é quanto a nossa sexualidade marchemos por ela. A nossa sexualidade pode ser a nossa não relação com os homens! Ou pode ser também a nossa não sexualidade! Ou a nossa sexualidade está estritamente ligada aos homens e ao que os outros esperam de nós? E seria isso “nossa” sexualidade?

Que a marcha atinja a maioria da pessoas, eu compreendo, pelo espetáculo que virou, pela cobertura midiática e pela genuína necessidade de reivindicar os direitos das mulheres. Mas ela é uma verdadeira bomba de contradição ao feminismo. Ela fere as propostas feministas ao que se estende para todas as mulheres, que além das mulheres sofrerem discriminação e violências, que classe e cor da pele são determinantes para ditarem a maneira de como serão tratadas. Conscientes disso, porque deveríamos nos engajar em ações reformistas como esta?

A Marcha fala de estupro e sexualidade mas de uma forma a apagar demandas feministas importantíssimas. Lutamos pela nossa liberdade sexual, esta liberdade sexual não é liberdade se ela está totalmente inserida no contexto patriarcal, e nos jogos que este impõe de controle, onde o homem domina e a mulher é subjugada e objetificada. Numa sociedade que cansa de justificar o estupro como uma “urgência incontrolável” masculina (para isso servem as “prostitutas”, certo?), ou seja, uma via da sexualidade do homem, enquanto na verdade o estupro é apenas a confirmação de poder e do ódio às mulheres.

Não é uma questão de ser muito dura nas críticas, é uma questão de observar uma falta de consideração e solidariedade com as mulheres prostituídas, com as mulheres negras, as dos povos originários, de etnias, e com todas mulheres que são ou foram tratadas como vadias e vivem uma vida se esforçando para se livrarem destes traumas e de situações brutais, e que apenas a palavra vadia as fazem relembrarem de algo que elas carregam pesadamente. Se as mulheres que vão a marcha preferem ignorar milhões de outras mulheres, são elas que estão sendo duras, a diferença é que elas se consideram alegres, divertidas e liberadas e estão centradas na sua catarse individual. E mesmo que tenham direito obviamente de viverem suas catarses, elas só não podem dizer que estão se solidarizando com todas nós as outras mulheres que sentimos na pele o que é sermos tratadas como vadias. Não, elas não estão.

 

Larga Viva – uma carta de repúdio a declaração de Paz Berti

Está sendo organizado para o dia 15 de março a Larga Viva, um evento pelo mês de março, para lembrar o dia 8, dia das mulheres, dia de luta.

Eu recebi um convite via e-mail para o evento e nele havia um link para o evento.

Acessei o link e tive o desprazer de ver a discussão gerada adivinhem pelo que? Tenho certeza que muitas já adivinharam, pois é, estão discutindo em como é excludente e autoritário o evento ser exclusivo de mulheres! Como ousam as mulheres fazerem um evento por elas e para elas?

Tudo começou porque o MC chamado Paz Berti se diz “censurado”, excluído e classificado porque não vai “poder” tocar neste evento pelo dia das mulheres que ousam serem as protagonistas do evento!

Ele diz assim:’Só queria informar que me tirarem da programação do próximo Largo Vivo por ter pênis e não xereca. Ta todo o errado!!! Tenho que lutar diariamente com atitudes machistas, homofóbicas e agora algumas femistas se sumarem. É complicado pensar um feminismo de esse jeito.’

Sim, é verdade, eu também custei a acreditar em tamanha ignorância e misogina. E tudo isso vindo de quem? De um cara que se diz feminista. Nem vou mencionar o fato que ele usou a palavra “femista”.

Vamos então colocar umas coisas para você Paz.

Primeiro, que você pode se dizer feminista mas isso não significa que: 1)você seja um 2) que homens possam ser feministas 3) qual “jeito” é o “feminismo certo” para você Paz Berti.

Você poderia ser uma aliado talvez, mas isso você também não é porque você acabou de demostrar.

O que aconteceu é que um homem se sentiu machucado e tá muito triste porque as mulheres não lhe priorizaram! E ele se diz feminista! Fala sério!

Notem que quando ele se refere a vagina ele fala “xereca”!, já ao se referir ao seu lindo pênis ele usa a palavra….pênis. Ele diz que sofre diariamente com atitudes machistas e homofóbicas e ele mesmo tem atitudes machistas e homofóbicas, e misóginas! É misoginia desqualificar a vagina em primeiro lugar! E é machismo supervalorizar seu pênis meu querido, caso você não saiba.

E aí este mesmo cara posa numa foto de saia sem camisa com uma garota do lado de mãos dadas também sem camisa, onde nos seus corpos está escrito “nem homem” “nem mulher”. Porém caro Paz, por mais que você ande por aí de saia você continua sendo privilegiado. E caso você não saiba você não é oprimido pelo patriarcado, você no máximo sente desconforto com as regras do mesmo, mas você é PRIVILEGIADO pelo patriarcado, de tal forma que basta você trocar suas saias por uma calça. Já nós mulheres mesmo de calças somos assediadas nas ruas, somos estupradas todos os dias, assassinadas por termos XERECAS (arg, que nojo esta coisa que fede a peixe já disseram muitos homens gays nos anos 70). Ou seja, não vai fazer nenhuma diferença para mim usar roupas neutras, hum seriam “masculinas”? Ou usar roupas que foram feitas para mulheres usarem.

Seguindo o show de horrores machista, ele tem apoiadoras que não titubearam em sair para “ajudá-lo”, em sua defesa, pobre coitadinho. Sabem por que isso acontece? Porque nós mulheres somos educadas para darmos prioridade aos homens. Porque nós mulheres sempre temos que ser apaziguadoras, porque nós mulheres estamos ‘classificadas’ – para usar o termo usado por Paz – como da classe inferior. Logo nós internalizamos o machismo e também somos capazes de atitudes machistas e misóginas. E é por isso que o feminismo existe caso você não saiba, para lutarmos contra o machismo e a misoginia vigentes e institucionais, lutarmos por nossa autonomia que inclui reaprendermos e buscarmos o que nos foi tirado e negado.

Uma das garotas que lhe defende diz assim:“Te ajudo e descolamos todo um equipo pra fazer dois palcos.Se ser feminista eh isso Sigo sendo anti machista e libertária.”

Sim gente, eu não estou inventando.

Eu também não acredito que passa pela cabeça de alguém alterar a programação, passar por cima literalmente das decisões e /ou vontades de outras mulheres para defender um homem, e tudo isso, ambxs dizem em nome do feminismo!

Pois o feminismo não é não uma luta para favorecer os homens! Ah não sabia! Pois é, o feminismo é uma luta das mulheres para as mulheres. E muitos homens que sentem desconforto com o machismo, que se sentem mal serão igualmente beneficiados nesta luta das mulheres.

Nós não seremos nem salvas, nem libertas, nem protegidas por vocês homens. São os homens que nos assediam nas ruas e em todos os espaços(trabalho, escolas, lazer, etc), são os homens que nos estupram, nos ameaçam, nos agridem física, emocional e verbalmente. Assim como você Paz acabou de fazer. Você está nos agredindo por não receber o tratamento que você acha que merece. E isso se dá por causa do seu privilégio, porque você não foi educado para ser excluído não é mesmo? Você cresceu tendo todos os espaços internos e externos sendo seus!

Nós não! Nós fomos educadas como inferiores e crescemos lutando por espaços ou nos conformando que os espaços não são nossos. Nós só temos estas duas opções. Nos conformar ou lutar!

Não Paz, você não é feminista, sinto lhe dizer. Você deve repensar o que você está sendo para o feminismo, para as mulheres e lésbicas, e repensar suas atitudes.

O machismo não se luta com paz. O machismo se enfrenta com muita luta, com muita batalha, até porque o machismo é a guerra não declarada contra as mulheres.

 

Copa do Mundo e a Exploração de Mulheres

A Adidas lançou camisetas para a Copa do Mundo de 2014.

Não me surpreendeu o motivo das camisetas: a objetificação da mulher brasileira e o incentivo do turismo sexual. Numa das estampas uma mulher está de biquíni (obviamente) com a frase “lookin’ to score in Brazil”, que é uma expressão que quer dizer “levar uma mulher para a cama”. A outra estampa é um coração que também é uma bunda de biquíni! É absolutamente absurda a proposta de camisetas da Adidas. O Brazil é bem conhecido mundialmente como destino de turismo sexual e na copa do mundo estima-se que haverá um grande aumento na exploração de mulheres, adolescentes e crianças.

Além de todo absurdo que é a existencia da copa por si só, os desalojos, a gentrificação, a repressão e a violencia policial, a perseguição dos movimentos sociais, que já estão acontecendo, as mulheres mais uma vez são alvos da estrutura capitalista patriarcal. A subjugação das mulheres é norma. As mulheres são estupradas e exploradas sejam nas guerras, sejam em “celebrações”, sejam no cotidiano.

Me angustia ver que mesmo no feminismo existam muitas pessoas que preferem não ver que a exploração sexual de mulheres só existe pela gigantesca diferença de oportunidades entre mulheres e homens.

As camisetas da Adidas além de incentivarem o turismo sexual, são uma ofensa e uma contribuição para que se continue tendo a mulher brasileira, assim como toda latina americana, especialmente as mulheres negras, como mulheres “quentes”, para nos manterem como objetos sexuais para o prazer masculino.

Parem com a exploração das mulheres!

Parem com a cultura do estupro!

Não vai ter copa!