O Patriarcado data de no mínimo cinco mil anos de diferença do capitalismo. O antecede.
Logo, com o fim do capitalismo não está garantida nossa libertação. Ela não se dará automaticamente.
Ao constatar isso eu entendi o que é ser feminista. Ser feminista é viver numa luta sem fim, porque ser mulher já é viver numa guerra. Mesmo que a gente não perceba, mesmo que a gente reproduza comportamentos que corroboram com o patriarcado, é exatamente isso que estaremos fazendo: contribuindo com o patriarcado a nos explorar e oprimir. Quando nós mulheres reproduzimos esses comportamentos nós não somos beneficiadas. As únicas pessoas beneficiadas serão os homens, mesmo os que negam o benefício, porque eles podem ser beneficiados mesmo que não queiram, assim que precisarem ou decidirem que tal momento se faz necessário que se utilizem do benefício.
Ser feminista acima de tudo é aprender a estar só. Uma feminista sempre vai invariavelmente estar só numa parte da sua vida ou por toda ela. Eu falo de só de verdade. Até que ela vai encontrar outras mulheres que estão igualmente sós e ela vai aprender o que é o amor entre mulheres, o que é valorizar uma amiga, dar abertura para uma desconhecida. Inevitavelmente esse agora grupo de mulheres vai se deparar constantemente com rechaço, vai ter que explicar o porquê de sua existência e importância, vai ter que se explicar em casa também. Inúmeras vezes você vai se ver entrando e saindo de grupos que não conseguem se manter porque existe muita pressão para que esses grupos acabem. A pressão pode se dar de forma direta ou indireta. Uma pressão direta é o grupo receber fortes críticas pela forma como atua, geralmente colocada por um grupo de homens ou outro grupo com outro interesse político, ou ainda, ser atacado. Uma pressão indireta vai se dar no âmbito privado, que vai dificultar seu engajamento com suas companheiras feministas. A pressão indireta também se subdivide, ela pode acontecer, por um familiar ou parceiro que pode questioná-la do porquê do envolvimento dela com o feminismo, como por um parceiro ciumento, abertamente ciumento, e o grau de pressão aqui vai se subdividir de novo entre os ciumentos mais brandos até os mais violentos. Já a outra forma de pressão indireta é aquela que não lhe dará tempo para que se engaje ou afetará o seu grau de engajamento porque ela cuida da filha, ou dos filhos, ou da mãe ou do pai, do avô, da sobrinha, da tia, ou dos afazeres domésticos, além de trabalhar ou de ter outras responsabilidades. A desistência ou falta de engajamento com o feminismo também se dá pelo medo de ser abandonada ou ostracizada.
Eu escrevo agora as duas e meia da madrugada depois que eu consegui cumprir com meus outros prazos. Essa não é uma informação relevante em si mesma não fosse pelo fato de ter percebido a uns momentos atrás que quase desisti de escrever porque eu to cansada.
Mas eu sei que eu to mais cansada de como o patriarcado afeta minha vida e de todas as mulheres. Eu to mais cansada de lutar diariamente desde que nasci. E também eu não desisti de escrever esse chamado, porque eu decidi lá bem atrás no meu caminho, que essa luta é uma responsabilidade minha, eu escolhi assim, dentro das minhas opções de escolha, que também não me parecem ser bem caracterizadas como escolha.
Eu amanhã, ou, hoje logo mais, estarei me encontrando com minhas amigas e com outras mulheres feministas ou não. Eu irei nesta ou naquela atividade. E eu estarei as 17h na Greve Internacional de Mulheres por todas essas razões que eu coloquei aqui.
Se isso é um erro para alguns, eu vou ter tentado.
Nenhuma pessoa ou entidade é dona da Greve ou sozinha a representa, se existe tentativa de cooptação por grupos, ela deve igualmente ser combatida.
Vem, vamos tentar juntas, mais uma vez e para todo sempre, até que alcancemos a vitória, mesmo que isso só aconteça quando já não estivermos mais aqui.
Aline Rodrigues